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Noivo Neurótico, Noiva Nervosa: um ponto de virada nas comédias românticas

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Noivo Neurótico, Noiva Nervosa: Woody Allen IMAGINE SE O PERSONAGEM NEURÓTICO DE WOODY ALLEN TIVESSE NAS MÃOS UM... CELULAR! O filme Noivo Neurótico, Noiva Nervosa é de 1977. Dirigido por Woody Allen, marca um ponto de virada na carreira do cineasta, até então conhecido do grande público por suas comédias escrachadas. Venceu quatro óscares: melhor filme, melhor diretor, melhor atriz para Diane Keaton e melhor roteiro original, para Woody Allen em parceria com Marshall Brickman. Volta e meia esse filme me vem à mente, por dois motivos. Primeiro, por causa do seu título.         Cá entre nós, Noivo Neurótico, Noiva Nervosa é um título ridículo! Suspeito que os distribuidores no Brasil tentaram manter algum vínculo com a imagem do Wood Allen destrambelhado que fazia rir em O Dorminhoco , Bananas e Tudo o Que Você Sempre Quis Saber Sobre o Sexo - Mas Tinha Medo de Perguntar . Não perceberam que o diretor chegava com uma abordagem diferente. Essa comédia romântica exigia mais do espectad

O Palhaço: sublimando a crise existencial

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O Palhaço: filme dirigido por Selton Mello SE HÁ ALGUM MOTIVO PARA FAZER CINEMA, É PARA REALIZAR BONS FILMES COMO ESSE – Esse negócio de crise existencial é palhaçada – diria meu pai, emendando algum comentário politicamente incorreto sobre ter mais o que fazer ao invés de ficar ouvindo nhenhenhém de gente afrescalhada. Conhecendo o senso de humor dele, é claro daria um desconto. Esse era apenas o seu jeito de mostrar que preferia manter a mente ocupada com as demandas práticas da vida a remoer assuntos filosóficos.           Não puxei ao meu pai. Filosofar e divagar são hábitos que trago desde que fui alfabetizado. Nesses momentos, nós, os sonhadores, ficamos vulneráveis ao assalto das dúvidas. Pior, levamos as dúvidas conosco e esbarramos nelas quando temos que tomar decisões cruciais: trocar o emprego estável e sufocante por uma aposta empreendedora, tornar-se coadjuvante no sonho de quem se ama para continuar seguindo juntos, assumir o fato de que as crianças já estão todas criadas

À Procura da Felicidade: história real vivida por Chris Gardner

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À Procura da Felicidade: filme de Gabrielle Muccino O TRIUNFO DO INDIVÍDUO SOBRE AS FORÇAS QUE TENTAN ARRASTÁ-LO PARA O REBANHO Acompanhando o título original em inglês, penso que em português esse filme poderia se chamar À Procura da Filicidade – escrito com “i” ao invés de “e”. É assim, com a grafia errada, que Chris Gardner encontra a palavra desenhada numa parede da escola do filho, quando vai buscá-lo depois de um dia difícil. Ele percebe o erro e se dá conta de que o desleixo com o que é correto, por menor que seja, só leva à corrosão dos valores mais caros ao ser humano. Então ele segue na retidão. Come o pão que o diabo amassou, mas insiste no único bem que possui: a capacidade de lutar honestamente enquanto tiver forças.           Porém, Chris Gardner chega ao fundo poço! Vendedor talentoso e hábil com números, investiu tudo o que tinha numa falsa oportunidade. Perdeu tudo! Sem fonte de renda e sem lugar para morar, perambula com o filho em estado de indigência. O filme  À Pr

O Silêncio dos Inocentes: um psiquiatra culto, refinado, sedutor e... canibal

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O Silêncio dos Inocentes: filme dirigido por Jonathan Demme UM DOS FILMES MAIS EMBLEMÁTICOS DOS ANOS 1990 Nos grandes filmes, as forças narrativas devem estar equilibradas: metade áudio, metade visual. O cineasta precisa ter refinamento artístico e domínio da expressão gráfica, para capturar os planos certos, posicionar a câmera na distância necessária e lidar com a luz  – ou a ausência dela. Porém, se esquecer do universo sonoro, jamais conseguirá criar a atmosfera adequada para conduzir as emoções do espectador. Em Hollywood, um dos cineastas que reunia qualificações nas duas áreas era Jonathan Demme – além de comédias dramáticas ele filmou vários espetáculos musicais. Seu filme de 1991, O Silêncio dos Inocentes , acabou se tornando um dos mais emblemáticos daquela década.           Quando se fala em O Silêncio dos Inocentes , o primeiro nome que vem à mente é Hannibal Lecter, mas o de Clarice Starling tem que ser pronunciado imediatamente na sequência. Thomas Harris criou ambos os p

Hair: uma renovação importante na arte dos musicais

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Hair: filme dirigido por Milos Forman ANUNCIANDO A POTÊNCIA ARTÍSTICA E MUSICAL DA ERA DE AQUÁRIO Um bando de hippies praticando paz e amor, enquanto festejam o hedonismo, bradam contra a guerra, repudiam o conservadorismo e pregam a contracultura. Parece antiquado e datado? Nas mãos de Miloš Forman, não! Em Hair , filme de 1979, ele faz uma adaptação para o cinema de um musical de sucesso na Broadway e extrai dele uma enorme potência artística e musical. O roteiro de Michael Weller cria um enredo e direciona o fluxo dramático da cantoria, trabalhando os personagens com mais detalhes.           Apenas privilegiados tiveram a oportunidade de assistir ao musical Hair , escrito por James Rado e Gerome Ragni, que estreou na Broadway em 1968. Mas qualquer um de nós tem acesso ao filme. Sua adaptação para o cinema não se limitou ao registro das canções marcantes e inesquecíveis, ou do peculiar visual da tribo hippie. O diretor soube desenvolver os personagens e criou uma trama envolvente. Se

15h17: Trem Para Paris: um história real

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15h17: Trem Para Paris: filme de Clint Eastwood PESSOAS, PERSONAGENS, ATORES... TODOS MISTURADOS NA MESMA DRAMATIZAÇÃO Imagine que você está envolvido em uma reconstituição policial: depois de ouvir as testemunhas, colher os depoimentos dos criminosos e estabelecer as ações que afetaram as vítimas, procura encenar os fatos de acordo com as diferentes versões. Coloca todos de volta na cena do crime e revive os acontecimentos na presença de peritos e autoridades, com o objetivo é descartar as versões improváveis e ficar com a única que, de acordo com as evidências, reflete a verdade. Você não está interessado em expressar significados ou extrair relevância artística da encenação – muito embora isso seja inerente a qualquer interação entre seres humanos. Tudo o que você quer é realizar um procedimento burocrático.           Eis aqui um modelo narrativo ao qual o grande público jamais tem acesso – fica restrito às esferas judiciais e se traz alguma função estética, apenas os advogados, juí

O Dilema das Redes: propaganda disfarçada de documentário

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Dilema das Redes: filme dirigido por Jeff Orlowsky NÃO PASSA DE UMA PEÇA DE PROPAGANDA A FAVOR DA REGULAMENTAÇÃO DAS REDES SOCIAIS As grandes corporações da mídia perderam poder com o advento da internet. O que fazem agora? Dizem que as redes sociais são “malvadas”, para inventar meios de controlá-las. Querem que tudo volte a ser como antes: apenas o consórcio formado pela imprensa, a grande mídia e os políticos fazendo a cabeça do povo. O Dilema das Redes , filme de 2020 dirigido por Jeff Orlowski é uma peça de propaganda arquitetada para acabar com a liberdade na internet.           A mídia manipulando jovens para influenciar seus hábitos não é novidade. Desde que Gutemberg inventou a imprensa jamais tivemos paz. A diferença é que agora há uma inteligência artificial capaz de refinamentos inimagináveis. Somos bombardeados por mensagens sedutoras? Sim! Mas temos uma liberdade de escolha sem paralelos com outras épocas. Lemos, assistimos, escutamos e interagimos com a informação de for

Tempo de Matar: uma história onde o racismo interfere nos julgamentos

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Tempo de Matar: filme de Joel Schumacher CINEMA DENUNCIANDO PRECONCEITO RACIAL, DILEMAS MORAIS E LABIRINTOS JURÍDICOS  O escritor John Grisham ficou famoso por seus romances de tribunal. Já vendeu mais de 300 milhões de exemplares ao redor do mundo e se tornou o número um no segmento dos thrillers de tribunal. Nove dos seus romances foram adaptados para o cinema, mas o primeiro que escreveu – em 1989, apenas três anos depois de se formar advogado – foi Tempo de Matar , que chegou às telas em 1996 dirigido por Joel Schumacher. O autor já havia visto três dos seus títulos virarem filme: A Firma , O Dossiê Pelicano e O Cliente , mas dessa vez decidiu interferir mais diretamente na adaptação. Envolveu-se como produtor, convocou Joel Schumacher para a direção e tratou de impor a concepção de filme que havia imaginado quando concebeu a história.           Tempo de Matar traz uma história bem costurada. Jake Tyler Brigance (Matthew McConaughey) é um advogado trabalhando no estado do Mississ

O Impossível: a história real da família de María Belón

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O Impossível: filme de Juan Antonio Bayona REALISMO NÃO BASTA, É PRECISO EXTRAIR EMOÇÃO Quando a costa da Tailândia foi arrasada por um tsunami, no Natal de 2004, as imagens da destruição entulharam nossas televisões e inundaram de tristeza as comemorações de final de ano em todo o mundo. Foram mais de 230 mil vítimas fatais e uma quantidade inimaginável de feridos – física e emocionalmente. As narrativas do desastre ocuparam espaço em toda a mídia, sempre numa abordagem jornalística. Reportagens, mesmo as que elevam o tom para entrar na disputa pela audiência, costumam priorizar o conteúdo informativo, mostrando respeito para com os que sofreram perdas. Mas o cinema, com sua vocação para a dramatização, está mais interessado na emoção, na dor, no sofrimento... Quando decidi assistir ao filme O Impossível , dirigido em 2012 pelo espanhol Juan Antonio Bayona, tive receio de tropeçar em mais uma produção apelativa do gênero catástrofe, recheada de efeitos especiais realistas, planejados

Se7en - Os Sete Crimes Capitais: um filme forte com final surpreendente

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Seven- Os Sete Crimes Capitais: filme de David Fincher UM THRILLER ONDE AS VÍTIMAS SÃO PECADORES E OS POLICIAIS, ATORMENTADOS Quando um velho à beira da aposentadoria reclama da decadência moral que se abateu sobre a sociedade, os mais jovens tendem a pensar que se trata apenas disso mesmo: da velhice que se abraça com a rabugice, para implicar com os novos comportamentos que a modernidade vai moldando. O erro de quem acusa é a generalização – a decadência moral é real, mas desde sempre acontece em nichos. O erro dos que se defendem é o desdém – abrem mão de certas regras de conduta para tolerar um novo comportamento, só porque ele é... novo.           Agora, quando um jovem reclama da decadência moral, aí já é outra história! O jovem a quem me refiro é Andrew Kevin Walker, o roteirista que escreveu Se7en: Os Sete Crimes Capitais , filme de 1995 dirigido por David Fincher. Trata-se de um dos melhores thrillers policiais dos anos 90, que chegou aos cinemas trazendo um clima de mistério

Menina de Ouro: a história de Maggie Fitzgerald é real?

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Menina de Ouro: filme de Clint Eastwood QUEM FORNECE MATÉRIA-PRIMA PARA OS BONS DIRETORES? A VIDA! Em termos numéricos, o mundo do boxe é para poucos. O mundo do boxe feminino, então, é para muito poucos. Agora, pense num filme que visita esse mundo árido e flagra seus habitantes nos momentos de maior solidão, desilusão, sofrimento e tristeza. Isso afugenta o público e limita ainda mais o tamanho da audiência. Entretanto, Menina de Ouro , filme de 2004 dirigido por Clint Eastwood, conseguiu o improvável: conquistou prêmios, saiu-se bem nas bilheterias e acabou se tornando um dos melhores filmes do diretor. O motivo? É uma história fictícia, mas verossímil, com sólidos elementos dramáticos e muito bem focada nos seus personagens.           O tema principal de Menina de Ouro é a busca por uma segunda chance na vida. É sobre como as pessoas se agarram às oportunidades de um novo recomeço, mas não estão preparadas para as desilusões, ainda que elas sejam prováveis. Todos os personagens se

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