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Fratura: um thriller de suspense com roteiro trincado

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Fratura: filme dirigido por Brad Anderson UM ROTEIRO MAIS PREOCUPADO EM MANIPULAR O ESPECTADOR O tema desse filme é a insanidade. O protagonista será confrontado com ela, cena após cena, e consumirá todas as energias tentando mostrar a todos que não é louco. Mas o grande problema da loucura é justamente descobrir-se tomado por ela, durante um lampejo de consciência! Reconhecer-se louco ao observar a sanidade acenando da estação, enquanto o trem da sua existência parte acelerando. É esse o momento crucial que esperamos ver no final de Fratura , filme de 2019 dirigido por Brad Anderson, mas seu protagonista não vive tal experiência. Perde-se no meio do caminho.           A premissa do filme é ótima: durante uma viagem de carro com a esposa e a filha, Ray faz uma parada. A garotinha sofre uma queda e quebra o braço. No hospital mais próximo, mãe e filha seguem para a sala de exames enquanto Ray espera na recepção. Adormece e quando acorda, não há sinal delas. Médicos e atendentes tentam c

O Homem nas Trevas: suspense e terror num filme autoral

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O Homem nas Trevas: Fede Alvarez TENSÃO E SUSPENSE QUE NASCEM DO PLENO DOMÍNIO DAS TÉCNICAS NARRATIVAS Numa Detroit falida e vazia, três jovens assaltantes descobrem uma barbada: invadir a casa de um velho cego, que tem muito dinheiro guardado. O que eles não sabem é que ele também guarda segredos e é dono de uma fúria insana. Em O Homem nas Trevas , filme de 2016 escrito e dirigido por Fede Alvarez − o jovem prodígio uruguaio descoberto por Hollywood − a tensão crescente é de grudar na poltrona. Nessa história onde todos são bandidos, quase não dá tempo para respirar.           O Homem nas Trevas  conta como Rocky (Jane Levy), Alex (Dylan Minnette) e Money (Daniel Zovatto) descobriram um jeito de assaltar casas numa Detroit esvaziada pela crise econômica: vasculham o cadastro da empresa de segurança do pai de Alex e escolhem as melhores oportunidades para agir. Quando os três delinquentes ficam sabendo que o velho Norman Nordstrom (Stephen Lang), um ex-combatente cego que vive sozinho

Perfume de Mulher: um remake que encanta pelas cenas memoráveis

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Perfume de Mulher: filme dirigido por Martin Brest A MAGIA ACONTECE Q UANDO UM CEGO CONSEGUE ENXERGAR A SI MESMO O que há de novo que possa ser dito sobre  o filme  Perfume de Mulher , que o leitor ainda não saiba? Detalhes dos bastidores? Curiosidades sobre o roteiro? Fofocas a respeito dos atores? Tal conteúdo está disponível com fartura na internet, ao alcance de poucos cliques. O motivo que me leva a mencioná-lo mais uma vez aqui na Crônica de Cinema – há tempos postei um vídeo com a memorável cena do tango, onde Gabrielle Anwar e Al Pacino dançam ao som de Por Una Cabeza – é na verdade bem simples: lembrei desse filme depois de divagar sobre a busca pelo autoconhecimento.           Essa palavra tem sido pronunciada com frequência na mídia e nas redes sociais, como instrumento eficiente para alcançar uma tão almejada evolução pessoal e moral. Mas de que maneira alguém pode verdadeiramente se autoconhecer? Encarando-se no espelho? Olhando para o próprio umbigo?  Escavando a própria

A Testemunha: filme de 1985 continua emocionante

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A Testemunha: filme dirigido por Peter Weir QUANTAS CENAS MEMORÁVEIS PODEM SER INCLUÍDAS NUM FILME? QUANTAS COUBEREM! Não espere profundidade psicológica dos personagens nem densidade dramática no roteiro. O filme A Testemunha , de 1985, é um drama policial para consumo ligeiro, mas muito saboroso. Esse sabor adicional se deve ao talento e ao empenho de Peter Weir, o diretor que chegou a Hollywood para impor seu jeito de fazer cinema. Consagrado como um dos principais nomes da New Wave australiana, enxergou na história do detetive que se esconde numa comunidade Amish, fugindo de tiras corruptos, uma oportunidade para criar cenas memoráveis, realizadas com sensibilidade e bom gosto. Vamos à sinopse:           A Testemunha conta a história de John Book (Harrison Ford), o policial encarregado de uma investigação de assassinato numa estação de trem da Filadélfia, que esbarra numa testemunha ocular: Samuel (Lukas Haas), um garoto de oito anos que viaja com a mãe, Rachael (Kelly McGillis),

A Onda: baseado em fatos que um dia podem ser reais!

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A Onda: filme dirigido por Roar Uthaug CINEMA NORUEGUÊS MANIPULA CLICHÊS E ACABA NUMA GRANDE CATÁSTROFE Cineastas costumam ser fisgados pela sétima arte logo na infância. A possibilidade de criar realidades alternativas, iludir com efeitos especiais e dar asas à imaginação, confere um tom lúdico à criação cinematográfica, sugerindo que tudo não passa de pura diversão. Aqueles com habilidades narrativas logo encontram o caminho da profissão, o que não os impede de continuar se divertindo muito ao longo do processo. Esse parece ser o caso do diretor norueguês Roar Uthaug. Seu filme A Onda , realizado em 2015, é um autêntico exemplar do cinema catástrofe, que mistura ação, tensão e destruição, numa fórmula que esperamos encontrar nos melhores parques de diversões. Tem efeitos visuais dignos de Hollywood, mas vem também com uma forte personalidade nórdica.           Fã declarado dos filmes de terror e de catástrofe, Roar Uthaug embarca aqui num gênero consagrado, que lida com conceitos já

Cidadão Kane: por que ele é tão importante, afinal?

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Cidadão Kane: filme dirigido por Orson Welles COM ELE, HOLLYWOOD CONSOLIDOU SEU PROCESSO DE FAZER FILMES Cidadão Kane é um filme antigo, sem a velocidade e a fúria das produções modernas, mas merece ser visitado. Os críticos dizem que é o melhor filme de todos os tempos. Mas a final, por que ele é tão importante? Foi realizado há mais de 80 anos, é todo em preto-e-branco, repleto de cenas demoradas e ainda por cima traz diálogos intermináveis! Por que muitos críticos o consideram o melhor filme já produzido até hoje? Bem, para descobrir, é preciso examinar a obra. Cidadão Kane conta a história de Charles Foster Kane, milionário dono de uma cadeia de jornais. O personagem foi construído à imagem e semelhança do magnata William Randolph Hearst e interpretado pelo próprio Orson Welles. Garoto pobre, que se tornou um dos homens mais ricos do mundo, q uando morre passa a ocupar as manchetes dos jornais. Jerry Thompson (William Alland) é o jornalista encarregado de desvendar a vida do ma

Dunkirk: uma batalha dramática no início da Segunda Guerra Mundial

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Dunkirk: filme dirigido por Christopher Nolan PERSONAGENS FICTÍCIOS E SITUAÇÕES PROVÁVEIS EM FATOS VERDADEIROS Imagino o ecran como um portal dimensional, ligando o universo da arte audiovisual ao mundo real do espectador acomodado na poltrona. No escuro da sala de cinema, a telona tem uma aura de magia, praticada para enfeitiçar plateias. Já nas salas de estar, as telinhas se prestam a diversões adicionais: música, esportes, reality shows, novelas, desenhos animados... Cinema e televisão são dois portais diferentes, ainda que as tecnologias de hoje igualem as experiências sensoriais – as imagens dos aparelhos de TV estão cada vez mais incríveis! Muitos espectadores já não se importam em qual plataforma assistirão aos seus filmes e muitos diretores estão filmando para serem vistos até mesmo nos celulares. Ainda assim, continuo firme na minha convicção: há coisas que só o cinema feito para as telonas é capaz de ousar!           Dunkirk , filme de 2017 dirigido por Christopher Nolan é um

Noivo Neurótico, Noiva Nervosa: um ponto de virada nas comédias românticas

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Noivo Neurótico, Noiva Nervosa: Woody Allen IMAGINE SE O PERSONAGEM NEURÓTICO DE WOODY ALLEN TIVESSE NAS MÃOS UM... CELULAR! O filme Noivo Neurótico, Noiva Nervosa é de 1977. Dirigido por Woody Allen, marca um ponto de virada na carreira do cineasta, até então conhecido do grande público por suas comédias escrachadas. Venceu quatro óscares: melhor filme, melhor diretor, melhor atriz para Diane Keaton e melhor roteiro original, para Woody Allen em parceria com Marshall Brickman. Volta e meia esse filme me vem à mente, por dois motivos. Primeiro, por causa do seu título.         Cá entre nós, Noivo Neurótico, Noiva Nervosa é um título ridículo! Suspeito que os distribuidores no Brasil tentaram manter algum vínculo com a imagem do Wood Allen destrambelhado que fazia rir em O Dorminhoco , Bananas e Tudo o Que Você Sempre Quis Saber Sobre o Sexo - Mas Tinha Medo de Perguntar . Não perceberam que o diretor chegava com uma abordagem diferente. Essa comédia romântica exigia mais do espectad

O Palhaço: sublimando a crise existencial

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O Palhaço: filme dirigido por Selton Mello SE HÁ ALGUM MOTIVO PARA FAZER CINEMA, É PARA REALIZAR BONS FILMES COMO ESSE – Esse negócio de crise existencial é palhaçada – diria meu pai, emendando algum comentário politicamente incorreto sobre ter mais o que fazer ao invés de ficar ouvindo nhenhenhém de gente afrescalhada. Conhecendo o senso de humor dele, é claro daria um desconto. Esse era apenas o seu jeito de mostrar que preferia manter a mente ocupada com as demandas práticas da vida a remoer assuntos filosóficos.           Não puxei ao meu pai. Filosofar e divagar são hábitos que trago desde que fui alfabetizado. Nesses momentos, nós, os sonhadores, ficamos vulneráveis ao assalto das dúvidas. Pior, levamos as dúvidas conosco e esbarramos nelas quando temos que tomar decisões cruciais: trocar o emprego estável e sufocante por uma aposta empreendedora, tornar-se coadjuvante no sonho de quem se ama para continuar seguindo juntos, assumir o fato de que as crianças já estão todas criadas

À Procura da Felicidade: história real vivida por Chris Gardner

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À Procura da Felicidade: filme de Gabrielle Muccino O TRIUNFO DO INDIVÍDUO SOBRE AS FORÇAS QUE TENTAN ARRASTÁ-LO PARA O REBANHO Acompanhando o título original em inglês, penso que em português esse filme poderia se chamar À Procura da Filicidade – escrito com “i” ao invés de “e”. É assim, com a grafia errada, que Chris Gardner encontra a palavra desenhada numa parede da escola do filho, quando vai buscá-lo depois de um dia difícil. Ele percebe o erro e se dá conta de que o desleixo com o que é correto, por menor que seja, só leva à corrosão dos valores mais caros ao ser humano. Então ele segue na retidão. Come o pão que o diabo amassou, mas insiste no único bem que possui: a capacidade de lutar honestamente enquanto tiver forças.           Porém, Chris Gardner chega ao fundo poço! Vendedor talentoso e hábil com números, investiu tudo o que tinha numa falsa oportunidade. Perdeu tudo! Sem fonte de renda e sem lugar para morar, perambula com o filho em estado de indigência. O filme  À Pr

O Silêncio dos Inocentes: um psiquiatra culto, refinado, sedutor e... canibal

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O Silêncio dos Inocentes: filme dirigido por Jonathan Demme UM DOS FILMES MAIS EMBLEMÁTICOS DOS ANOS 1990 Nos grandes filmes, as forças narrativas devem estar equilibradas: metade áudio, metade visual. O cineasta precisa ter refinamento artístico e domínio da expressão gráfica, para capturar os planos certos, posicionar a câmera na distância necessária e lidar com a luz  – ou a ausência dela. Porém, se esquecer do universo sonoro, jamais conseguirá criar a atmosfera adequada para conduzir as emoções do espectador. Em Hollywood, um dos cineastas que reunia qualificações nas duas áreas era Jonathan Demme – além de comédias dramáticas ele filmou vários espetáculos musicais. Seu filme de 1991, O Silêncio dos Inocentes , acabou se tornando um dos mais emblemáticos daquela década.           Quando se fala em O Silêncio dos Inocentes , o primeiro nome que vem à mente é Hannibal Lecter, mas o de Clarice Starling tem que ser pronunciado imediatamente na sequência. Thomas Harris criou ambos os p

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