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Mostrando postagens com o rótulo Drama

Nefarious: terror psicológico inteligente

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Nefarious: direção de Chuck Konzelman e Cary Solomon REVELANDO A VERDADEIRA NATUREZA DO MAL Filmes de terror jamais me empolgaram. Para me fazer ocupar uma poltrona na sala de exibição, o título precisa vir acompanhado de ótimas referências – dos amigos, da crítica especializada ou dos cinéfilos que seguem a Crônica de Cinema. No entanto, Nefarious , filme de 2023 dirigido pela dupla Chuck Konzelman e Cary Solomon, chamou minha atenção, porque chegou etiquetado pela mídia como... terror cristão! Fiquei curioso. Ainda não sabia da existência de tal subgênero – aqui, o termo cristão vem carregado com um certo tom pejorativo. Então, tratei de conferir!           Vamos colocar as cartas na mesa de uma vez: Nefarious é um filme de terror, mas um terror psicológico. Não busca provocar sustos nem nos fazer desviar o olhar diante de cenas macabras de horror sanguinário. É um filme religioso, porque trata da possessão demoníaca, tema que está presente nos fundamentos do catolicismo. Está sendo

1984: a data continua como um mau presságio

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1984: direção de Michael Radford AINDA NÃO FOI EM 1984, MAS... Estava com 23 anos em 1984. Já não era mais um estudante e labutava numa multinacional para fazer minha carreira na publicidade. Então aconteceu uma revolução! Um comercial inovador, dirigido por ninguém menos que Ridley Scott, invadiu nossas televisões e mudou o jeito de pensar a comunicação. O produto anunciado era um novo computador da Apple, batizado de Macintosh – nome de uma variedade de maçã cultivada na Califórnia. O roteiro, criado pelos publicitários Steve Hayden, Brent Thomas e Lee Clow, da agência Chiat\Day, usava como mote o romance 1984 , escrito por George Orwell.           Observe que este famoso comercial de TV, com apenas um minuto de duração, não foi feito para vender um computador, mas para vender uma ideia! Recria a perturbadora cena dos pálidos trabalhadores robotizados, que servem de audiência para uma imensa tela com a imagem ameaçadora do Big Brother. Mas então, acontece algo que não estava no scrip

Alexandre: o grande rei que dominou o mundo antigo

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Alexandre: direção de Oliver Stone A MARCHA DO PROCESSO CIVILIZATÓRIO Sabia muito bem que, um dia, Alexandre o Grande acabaria caindo... na prova! Por isso tratei de estudar o básico: guardei na memória que aquele rei da Macedônia viveu no século 4 a.C, venceu suas mais importantes batalhas quando tinha apenas 18 anos e ao morrer, com 33, dominava 90% do mundo conhecido. Estudou com Aristóteles e montava Bucéfalo, um cavalo tão majestoso quanto ele. Era inteligente, corajoso e um líder capaz de mobilizar multidões em prol de sua desmedida ambição. Pacificou a Grécia, dominou o Egito, conquistou a Pérsia e rumou para o oriente, sem jamais aniquilar a cultura dos povos sob seu jugo. Ao contrário, promoveu uma integração com as crenças e valores que trazia de berço e assim disseminou a cultura helenística. Fundou várias cidades, todas elas chamadas de Alexandria. O sujeito foi rápido, implacável e eficiente. Em apenas 11 anos se tornou o homem mais poderoso do seu tempo e conquistou para

Som da Liberdade: uma história tristemente real

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Som da Liberdade: direção de Alejandro Monteverde LUTANDO CONTRA UM MONSTRO REAL Ah, o burburinho! Ele é essencial na promoção e divulgação de qualquer produto da indústria cultural. No caso de Som da Liberdade , filme de 2023 dirigido por Alejandro Monteverde, ele alcançou níveis de decibéis tão altos que virou estrondo nas bilheterias – façanha notável para uma produção independente de baixo orçamento. Espirrou polêmicas para todos os lados e alvoroçou as lombrigas ideológicas dos que se interessam por cinema e também por política. Ou seja, todos nós! Antes de comentar sobre esse filme, portanto, é melhor examinar como isso aconteceu.           O diretor começou a gestar o filme em 2015 e realizou as filmagens em 2018 com o financiamento de investidores mexicanos. A produção foi engavetada em 2019, quando a 21st Century Fox, que faria a distribuição, foi adquirida por uma Disney entupida de lançamentos já programados. Nesse meio tempo, o ator Jim Caviezel, que faz o papel do protagon

A Árvore da Vida: a densidade de um poema cinematográfico

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A Árvore da Vida: direção de Terrence Malick BUSCANDO UM SENTIDO ESPIRITUAL Com qual finalidade alguém clica no play e começa a assistir a um filme no serviço de streaming? Tal pergunta, feita assim, de supetão, gera uma diversidade de respostas: para passar o tempo, para se divertir, para se aprofundar em algum assunto, para aprender algo, para se emocionar... No final das contas, todas as respostas convergem para um único ponto: o objetivo é sempre fruir uma boa história. Quem se põe a assistir ao filme A Árvore da Vida , dirigido em 2011 por Terrence Malick, certamente espera acompanhar uma boa narrativa – nada mais natural para quem se depara com as fotos de Brad Pitt, Sean Penn e Jessica Chastain na capa e lê a sinopse sobre as desventuras de uma família texana na década de 1950. O problema, para os desavisados, é que o diretor é notório por seu estilo não narrativo e a história que se propõe a contar está tão entranhada nos corredores secretos da sua própria alma, que vem codific

Os Fabelmans: filmando verdades emocionais

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Os Fabelmans: direção de Steven Spielberg A VERDADE ESTÁ NO... CINEMA! O impulso de realizar um filme autobiográfico sempre apareceu para cutucar o diretor Steven Spielberg – tentação para qualquer contador de histórias contumaz. Os Fabelmans , que ele dirigiu em 2022, é finalmente essa tão aguardada obra. E nos chega com tamanha graça, vivacidade e profundidade emocional, que ouso colocá-lo entre seus filmes mais envolventes e arrebatadores.           Os cinéfilos – e a crítica cinematográfica – sempre enxergaram nos filmes de Spielberg diversos elementos reveladores de sua personalidade e de sua herança familiar. Sempre aparecem expostos nas entrelinhas dos seus roteiros e se tornaram conhecidos do público, na medida em que ele virou celebridade e se firmou como um dos maiores diretores da história do cinema. Agora, chegou o momento de Spielberg se revelar por inteiro, ousando um nível de exposição inédito.           Os Fabelmans é, sim, uma ousadia. Certamente provocou momentos int

A Luta Pela Esperança: uma história incrivelmente real

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A Luta Pela Esperança: direção de Ron Howard ESTÁ MAIS PARA PAI DE FAMÍLIA DO QUE PARA PUGILISTA Minha última crônica foi sobre o lutador de boxe asqueroso e desagradável retratado por Martin Scorsese no seu excelente Touro Indomável . Para ficar no tema, decidi escrever agora sobre o seu exato oposto, o lutador de boxe bom caráter e aferrado a sólidos valores éticos, que foi nocauteado pela grande depressão econômica na década de 1930, despencou para a miséria, mas conseguiu se reerguer e conquistar o título de campeão mundial dos meio-pesados. Sua história está contada no filme A Luta Pela Esperança , dirigido em 2005 por Ron Howard.           O protagonista dessa história verdadeira e tocante é James J. Braddock, um boxeador compenetrado no ringue e pai de família dedicado fora dele. Sua trajetória de superação, que lembra um conto de fadas, rendeu-lhe o apelido de Cinderella Man, dado por um jornalista esportivo chamado Damon Runyan – o que explica o título original do filme. A dim

Touro Indomável: um clássico memorável

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Touro Indomável: direção de Martin Scorsese UM PERSONAGEM QUE NOS LEVA PARA AS CORDAS O boxeador Jake LaMotta nunca foi um sujeito agradável. Ao contrário, esbanjava mau-caratismo. Esteve na prisão, estuprou uma mulher, espancou uma vítima até quase matá-la durante um assalto, meteu-se com o crime organizado, foi casado sete vezes e bateu em todas as suas mulheres. A violência estava por toda a sua ficha corrida. Nova-iorquino nascido no Bronx, era descendente de italianos e começou no boxe profissional aos 19 anos, em 1941, tonando-se campeão mundial na categoria peso médio em 1950. Depois da aposentadoria, comprou alguns bares e virou comediante. Também foi ator e participou de vários filmes. Lançou alguns livros, entre eles Raging Bull: My Story , escrito em parceria com os jornalistas Joseph Carter e Peter Savage. Apesar da vida conturbada, virou símbolo de coragem e se tornou um herói para os apreciadores do esporte.           Sinceramente, jamais senti um pingo de empolgação em a

Destemida: com a família dando apoio, sobra determinação!

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Destemida: direção de Sarah Spillane UMA HISTÓRIA INSPIRADORA, QUE NOS SERVE DE MODELO Colocar o filme Destemida , dirigido em 2022 pela australiana Sarah Spillane, lado a lado com o agora clássico Eu, Christiane F. - 13 Anos, Drogada e Prostituída , dirigido em 1981 pelo alemão Ulrich Edel, pode parecer uma aberração. Mas é justamente o que estou fazendo nesta sequência de crônicas, porque enxerguei entre os dois filmes uma forte conexão: a família. No primeiro, ela se impõe pela presença. No segundo, pela ausência! Ambos são protagonizados por meninas, personagens reais que alcançaram, cada uma ao seu modo, alguma projeção mundial. O primeiro filme é edificante e inspirador. O segundo é didático e nos serve de alerta.           Quarenta anos depois que a triste história de Christiane F. chocou o mundo, podemos assistir a um filme que segue na direção oposta. Destemida nos conta a jornada de Jessica Watson (Teagan Croft), uma australiana de apenas 16 anos que, em 2009, tornou-se a pe

Eu, Christiane F. - 13 Anos, Drogada e Prostituída: filme de 1981

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Eu, Christiane F. - 13 Anos, Drogada e Prostituída: direção de Ulrich Edel CONTUNDENTE, DIDÁTICO, REALISTA E ATUAL Neste fim de semana, Ludy e eu vivemos uma experiência de cinema um tanto peculiar. Assistimos a dois filmes protagonizados por meninas, um completamente diferente do outro. No entanto, encontramos neles uma conexão surpreendente: ambos falam de família, só que um nasceu pela falta dela e o outro, por causa dela. No primeiro, a família é uma abstração tão desfocada, que em momento algum lembramos dela. No segundo, a concretude da família é tão nítida, que não há como esquecer dela em nenhuma cena. O primeiro filme é Eu, Christiane F. - 13 Anos, Drogada e Prostituída , dirigido em 1981 por Ulrich Edel. O segundo é Destemida , dirigido em 2022 por Sarah Spillane.           Pensei em desenvolver uma única crônica falando dos dois filmes, mas logo percebi que seria impossível. Primeiro, porque exigiria muitos parágrafos além do usual. Depois, porque fugiria ao padrão da Crônic

O Último Samurai: até que ponto essa história é verdadeira?

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O Último Samurai: direção de Edward Zwick PERSONAGENS FICTÍCIOS E PREMISSAS VERDADEIRAS Há uma interseção entre os faroestes americanos e os filmes japoneses sobre samurais. Um gênero sempre inspirou o outro. Mais que isso, nutriram-se! Os arquétipos apresentados pelo mestre Akira Kurosawa em Os Sete Samurais , realizado em 1954 como uma homenagem aos cowboys, serviu de munição para filmes como Sete Homens e Um Destino , tanto o de 1960, dirigido por John Sturges, como o remake de 2016, de Antoine Fuqua. Cito aqui o exemplo mais óbvio, mas os cinéfilos antenados certamente serão capazes de resgatar outros, ainda mais surpreendentes. Mas em O Último Samurai , realizado em 2003 por Edward Zwick, os elementos se cruzaram para compor um drama épico, pontuado com cenas de guerra e personagens marcantes.           O filme conta a história de Nathan Algren (Tom Cruise), um atormentado capitão do exército americano – durante a Guerra Civil, participou do massacre de milhares de nativos durante

Marshall: Igualdade e Justiça: retrato de um herói autêntico

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Marshall: Igualdade e Justiça: direção de Reginald Hudlin TODOS NÓS SABEMOS O QUE É JUSTIÇA Dramas de tribunal acabaram agrupados em um gênero específico, tanto na literatura como no cinema. Autores como John Grisham, Aaron Sorkin e William Diehl exploraram as diferentes dinâmicas que se estabelecem nas cortes de justiça, usando elementos de mistério e suspense para segurar o leitor – e o espectador – até que o martelo seja finalmente batido. Souberam recitar os cânones e contornar os clichês, sem desapontar o público ávido por... justiça!           Sim, no final das contas, é esse o foco de qualquer drama de tribunal. Sejam leigos, sejam bacharelados, o que todos estão interessados é em ver a justiça sendo exercida em sua plenitude. Reconhecê-la no final, com suas imperfeições e promessas, porém cega e equilibrada e sendo exposta sem disfarces. Mesmo que, no final da trama, ela tropece em parcialidades, ainda assim saberemos que é ela, apenas representada por sua exata negação.       

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