O Cântico dos Nomes: uma ode imaginativa e original
O Cântico dos Nomes: filme de François Girard
UM DRAMA MUSICAL FICTÍCIO, AGARRADO NAS VERDADES SOBRE O HOLOCAUSTO
Antes de mais nada é preciso deixar claro: O Cântico dos Nomes, produção de 2019 dirigida pelo canadense François Girard, é um filme sobre o Holocausto. É um drama ficcional, com personagens inventados e situações imaginárias, mas transmite autenticidade e verossimilhança, a ponto de parecer inspirado em fatos. A produção é uma adaptação do romance com o mesmo título, escrito em 2002 pelo crítico musical britânico Norman Lebrecht, autor que conhece os bastidores do mundo da música erudita como poucos – ele mantém o blog de música clássica Slipped Disc. A história que ele nos conta é comovente e combina um profundo respeito pela fé religiosa, pelos valores familiares e pela linguagem musical.
O Cântico dos Nomes conta a história de Martin Simmonds. Quando garoto, ganhou um irmão adotivo, o prodígio do violino Dovidl Rappaport, que aos 9 anos é dono de uma arrogância quase tão grande quanto sua genialidade. O pequeno músico chega a Londres trazido da Polônia, para ficar sob tutela da família Simmonds, a pedido dos pais que desejam vê-lo completando os estudos de música. Mas quando os nazistas começam o extermínio sistemático dos judeus, os pais de Rappaport morrem em Treblinka. Martin e Dovidl crescem juntos e se tornam grandes amigos. O primeiro envereda pelos caminhos da produção musical, o outro desenvolve ainda mais seus talentos no violino, até que, aos 21 anos, fará sua primeira grande apresentação, acompanhado de uma orquestra. Para choque da família Simmons – que investiu na produção do grande espetáculo – o violinista desaparece com seu valioso instrumento. Nunca mais é visto! Então, na década de 1990, Martin tropeça com pistas que podem levá-lo a reencontrar seu irmão adotivo e resolver o mistério que envolve seu desaparecimento. O que vemos aqui é uma ponte ligando os universos da música e do cinema. Na verdade, essa ponte foi construída antes mesmo que o áudio se somasse ao visual para moldar a linguagem da sétima arte. Nos filmes, os músicos eruditos encontraram mais do que refúgio artístico, descobriram uma valiosa fonte de renda na luta pela sobrevivência – primeiro nos teatros, criando a atmosfera para os filmes mudos, depois nos estúdios, criando as trilhas sonoras incidentais do cinema falado. Nesse filme, porém, música e músicos se tornaram objeto do enredo, mostrando uma face dramática que o grande público desconhece.
A história de O Cântico dos Nomes cobre décadas e flagra seus personagens em três momentos diferentes. Martin Simmonds é interpretado por Misha Handley quando criança, por Gerran Howell quando jovem e por Tim Roth já maduro. Dovidl Rapoport é vivido na infância por Luke Doyle, na juventude por Jonah Hauer-King e finalmente por Clive Owen. Garantir a coesão nas intepretações foi um desafio encarado com competência por François Girard, um diretor experiente no trato com todos os tipos de produções musicais – já dirigiu as encenações de Parsifal na New York Metropolitan Opera, espetáculos do Cirque du Soleil e incontáveis filmes de curta metragem e outros tantos longas.
A adaptação do romance para as telas foi escrita pelo roteirista Jeffrey Caine, que embora tenha mantido a essência da escrita de Norman Lebrecht seguiu uma estrutura narrativa diferente. No livro, entre o momento que Martin encontra pistas sobre o paradeiro de Dovidl até o momento em que o dois se reencontram, percorremos apenas seis páginas. O que o roteirista fez foi construir seu filme a partir dessas poucas páginas para manter a força dramática e o suspense do começo ao fim.
Para filmar o roteiro, o diretor François Girard contou com a estreita colaboração do compositor Howard Shore, que já tem um Óscar pela trilha sonora de O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel. Ele encarou o desafio de criar uma composição original que precisava seguir parâmetros muito precisos – no caso O Cântico dos Nomes que dá título ao filme. Cabe lembrar que o título remonta ao ato de ler em voz alta todos os nomes dos judeus que perderam a vida em Treblinka, na forma de uma oração cantada e executada ao violino. Essa ideia é central na história e em torno dela orbitam todos os elementos musicais e dramáticos. As várias peças de violino apresentadas no filme foram executadas pelo renomado violinista Ray Chen, nascido em Taiwan e radicado na Austrália.
Para finalizar, uma curiosidade: o diretor tomou uma decisão ousada na hora de escalar o elenco. Para interpretar Dovidl Rappaport na infância, preferiu dirigir o garoto Luke Doyle, que é de fato um prodígio no violino e dono de uma inteligência precoce, mas jamais havia estado na frente de uma câmera. François Girard encontrou o jeito certo de trabalhar com ele em cena, regendo-o como faria um maestro. O resultado é incrível. O garoto convence por suas habilidades musicais e por seus recursos dramáticos. Ao contrário de Luke, os atores Hauer-King e Clive Owen tiveram que passar por horas de treinamento para interpretar um autêntico virtuoso do violino.
Resenha crítica do filme O Cântico dos Nomes
Ano de produção: 2019Direção: François Girard
Roteiro: Jeffrey Caine
Elenco: Tim Roth, Gerran Howell, Misha Handley, Clive Owen, Jonah Hauer-King, Luke Doyle, Stanley Townsend, Catherine McCormack, Saul Rubinek e Eddie Izzard
Filme denso e extremamente sensível, me fez chorar, quando o protagonista se depara com o cântico dos nomes das vítimas, no horror deTreblinka.
ResponderExcluirSim, essa é a linha central do filme e foi tratada com muita emoção. Também gostei!
ExcluirFilme belíssimo, vai até onde a sensibilidade é capaz de alcançar, e além Uma obra de arte do início ao fim. Uma joia rara, que trata em profundidade e com delicadeza extrema o pior dos horrores de que se tem notícia em nossa história.
ResponderExcluirFico encantada vendo a habilidade de sua redação. Vou rever esse filme, agora com mais motivação e interesse.
ResponderExcluirObrigado!
ExcluirGostei muito do filme, a ponto de buscar informações sobre ele. O texto bem escrito, rico em informações e com comentários objetivos e coerentes complementou o prazer que i filme proporcionou.
ResponderExcluirObrigado, Daniel Barcellos. Também gostei do filme e é um prazer compartilhar as informações que descobri sobre ele com quem, coo eu, gosta de cinema. Abraços.
ExcluirProcurando informações sobre o filme, antes de assistir, tive a sorte de encontrar seu texto. Parabéns pela redação. Raramente encontramos comentários tão bem escritos.
ResponderExcluirAh, Luiz Roberto, muito obrigado. Tenho me dedicado a comentar os filmes que me inspiram. É gratificante poder compartilhar essa experiência com gente que valoriza. Abraço!
ResponderExcluirO filme é excelente e vim pesquisar sobre a obra após já ter assistido. Infelizmente a cultura erudita e religiosa judaica não é muito requerida pelo mundo como um todo, no entanto, achei a obra incrível, me prendeu do início ao fim. Parabéns por sua publicação sobre o mesmo!
ResponderExcluirObrigado, Samuel. Também achei esse filme excelente. Também tive que pesquisar sobre ele e entrei num universo rico e interessante.
ExcluirFilmaço. Além disso Instiga à pesquisa e ao conhecimento. Recomendo.
ExcluirO filme é magnífico , tudo nele encanta ,não deixa tirar os olhos e ouvidos da tela .
ResponderExcluirFilme belíssimo. Fiquei em dúvida se era real ou não. Então, procurei informações. Mais uma história que remete ao Holocausto. Triste, real e que todos devem conhecer.
ResponderExcluirAh, Silvina, também assisti ao filme sem ter maiores informações. Gostei e parti para a pesquisa. É assim que vamos reunindo a nossa bagagem sobre cinema!
ExcluirBom dia
ResponderExcluirTexto ótimo ! Senti o filme na minha mente . Vou ver hoje se tiver na Netflix ou na Prime.
Bom dia! Vale a pena conferir!!!
ExcluirOlá, Fábio. Obrigado pela análise. Adorei o filme. Você sabe dizer qual o trecho que o menino Dovidl toca quando testa o violino que acaba de ganhar do seu padrasto?
ResponderExcluirSalve, Caio!!! Não tenho essa informação na manga, mas vou pesquisar. Se descobrir, aviso. Abraços!
ResponderExcluirMuito bom
ResponderExcluirExiste realmente uma música onde os nomes do mortos são citados para não serem esquecidos?
ResponderExcluirAh, não sei a resposta! A musicalidade do povo hebreu é tão impressionante quanto o seu fervor religioso. É provável que que esse tipo de canto seja tradicional e tenha uso frequente em rituais, mas não tenho envolvimento suficiente com a religião para tirar conclusões. O que sei com certeza é que a música usada no filme, para representar o canto dos nomes, foi especialmente composta e faz parte da trilha sonora encomendada pelo diretor.
ExcluirUltimamente, foi um dos melhores filmes que assisti. História, música, família e emoção.
ResponderExcluirSim, é um filme envolvente por completo!
ExcluirSeu texto é maravilhoso. Quem assistiu o filme pode visualizar cada cena por meio dos seus comentários. O filme realmente é belíssimo! Vai pra minha lista de melhores filmes.
ResponderExcluirAh, muito obrigado! Seu feedback é muito importante! Fico animado em continuar escrevendo!
ExcluirAs vezes fica difícil falar alguma coisa diante de tamanha beleza. Todo elogio que se faça, ainda parece muito pouco.
ResponderExcluirMeus parabéns 👏
Uma das mais belas e emocionantes cenas que já assisti foi o momento em que o rabino recita o cântico. A angústia dele ouvindo e torcendo para que os nomes das sua família sejam cantados. Cena maravilhosa
ResponderExcluirTb parti para a pesquisa ao final do filme p entender melhor sobre a religião judaica !!Filme belíssimo!! Uma obra de arte que toca a alma!! Família,amizade,amor, música, dor,religião, traição,…. emocionante !! Adorei !!
ResponderExcluirA prática de recitar os nomes dos que morreram anonimamente está baseada em Isaías 56.5: "Darei na minha casa e dentro dos meus muros um memorial e um nome...que nunca se apagará". O Museu do Holocausto em Jerusalém (Yad Vashem) significa exatamente isso: um memorial e um nome. No filme, os nomes são preservados através do cântico dos nomes.
ResponderExcluirGrato por esclarecer!
ExcluirAcabei de assistir o filme
ResponderExcluir. Dovidl sem dúvida é o personagem que mais me intriga .O egoísmo,a falta de senso de coletivo e até a forma traiçoeira que se encontrou com a Hellen após o ensaio,nas costas do Motl. alguém mais se incomodou com esse trecho do filme?
Tb me intrigou. Mas fui digerindo isso. O filme não está preocupado com o bom x o mal. Mas ao q nos leva a ter certos comportamentos. Depois de perder toda a família na guerra, submetida à crueldades extremas, o q era pra ele certo ou errado, bem ou mal. Oba fazia sentido? Nada. O encontro na sinagoga ressignifica a vida dele. É outra pessoa. Pra ele, ser violonista de sucesso seria uma questão de Ego. O sofrimento o distanciou do valor de ser bem
ExcluirSucedido. E ele diz q preferiu fazer um trabalho comunitário. Ser útil ao próximo. Ajudar as pessoas enquanto rabino. Confortar as pessoas da sua comunidade. Mas ainda estou pensando sobre o filme. Ainda não fechei tudo. Ainda ficam enigmas pra mim.
Belíssimo e triste de doer
ResponderExcluirAdorei o filme e seu texto sobre ele. Fazia parte de um grupo no Facebook cujo tema é o que a Netflix proporciona. Logo que terminou o filme corri a comentar no grupo o quanto achei o filme bom. Para minha surpresa o administrador do grupo não aprovou meu comentário. Sai do grupo…
ResponderExcluirObrigado perlo feedback. Também participo de alguns grupos de cinema. Faço isso para colher opiniões sobre os filmes e para postar links para as minhas crônicas. Infelizmente, alguns frequentadores de grupos gostam mais de polêmica do que de filmes.
ExcluirPungente! A similitude com o holocausto é de torcer a alma até que choremos pela irremediável sordidez humana.
ResponderExcluirSim, Lilian! E então, eis que agora encontramos, infelizmente, mais motivos para que o cântico dos nomes seja entoado. O mal e o horror insistem em nos assombrar!
ExcluirMuita delicadeza envolvida para falar do horror do Holocausto.
ResponderExcluirConheci o campo de extermínio de Treblinka e, a emoção transborda em cada passo dado.
Nem imagino o turbilhão emocional que você deve ter sentido, Janete. O filme é, sim, de uma delicadeza notável e respeitosa.
ExcluirO filme é um tesouro para quem tem paciência. O ritmo é lento mas é uma ficção que nos envolve totalmente.
ResponderExcluirSim, é um filme intimista, que se desenrola na velocidade certa para transportar com cuidado uma carga emocional muito pesada!
ExcluirAssisti e me emocionei muito. Achei que fosse verdade mas isso não importa. A arte faz isso. Traz uma ficção tão marcante que se torna inesquecível. E mostra de forma delicada como não devemos julgar as pessoas. Não conhecemos a verdade toda.
ResponderExcluirÉ maravilhosa essa capacidade humana de criar ficção e depois cultivá-la, vê-la crescer... Transitar pelo mesmo espaço da realidade!
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