A Lenda de Tarzan: o rei da selva continua em forma

Cena do filme A Lenda de Tarzan
A Lenda de Tarzan: direção de David Yates

O PONTO ALTO ESTÁ NA ORIGEM DO PERSONAGEM

Quando publicou sua primeira história sobre Tarzan, em 1912, o escritor americano Edgar Rice Burroughs jamais havia posto os pés na África. Precisou apenas de criatividade para conquistar uma posição cativa no imaginário popular – e na indústria cultural em escala global. Ah, e também usou um pouco de esperteza! Inspirou-se na obra de Rudyard Kipling, mais precisamente em O Livro da Jângal, publicado em 1894, que conta a história de Mogli, o menino-lobo, ambientada na Índia e protagonizada pelo órfão adotado por lobos. Para escapar do plágio, Burroughs transferiu sua história para a África e idealizou seu personagem como um filho da aristocracia inglesa, que termina adotado por macacos. Mesmo sem aprofundar seus conhecimentos sobre o continente africano, conseguiu escrever 25 livros de sucesso.
        Em 1929, Tarzan ganhou materialidade nas páginas dos jornais, por meio de uma tira desenhada pelo artista gráfico Hal Foster. Foi uma das primeiras séries de aventura, competindo com as tradicionais tirinhas cômicas que dominavam o universo das histórias em quadrinhos. Em 1937, Foster foi sucedido por Burne Hogarth, que passou a ser o desenhista mais fortemente associado ao universo de Tarzan. Das revistas baratas de literatura para os quadrinhos, depois para o cinema e para a TV, o tal homem-macaco veio se dependurando ao longo de todo o século XX, sem jamais sofrer quedas de popularidade. De geração em geração, a história do bebê de berço nobre, que cresceu um selvagem íntimo da selva graças às habilidades extraordinárias que herdou dos macacos, jamais deixou de despertar interesse.
        No entanto, nesse nosso início de século XXI, marcado pela esquizofrenia do politicamente correto, o musculoso “supremacista” branco, representante do imperialismo colonialista, que se dedica a aprontar horrores no continente negro, fatalmente acabaria caindo em desuso. Mas não! Eis que Hollywood retoma a saga do homem-macaco, em mais uma produção endinheirada, que tenta ganhar contornos de franquia. Trata-se de A Lenda de Tarzan, dirigido em 2016 pelo inglês David Yates. Antes que o leitor tire conclusões precipitadas, deixe-me avisar: é um bom filme, que combina aventura, ação, humor e algum envolvimento dramático, para oferecer entretenimento e diversão de qualidade.
        Esta nova aventura se passa nos anos finais do século XIX, quando o capitão Léon Rom (Christoph Waltz), um oficial belga enviado pelo Rei Leopoldo II, chega ao Congo com a missão de encontrar diamantes e estabelecer o domínio do país. No entanto, seu exército é dizimado por ferozes nativos, liderados pelo chefe Mbonga (Djimon Hounsou). Para o capitão Rom, não resta alternativa: aceita tomar parte no projeto de vingança de Mbonga e promete trazer Tarzan de volta ao Congo, em troca das suas cobiçadas pedras preciosas. Acontece que o agora Lord John Clayton, conde de Greystoke, está vivendo muito bem em sua mansão na Inglaterra, casado com Jane (Margot Robbie) e exercendo seu cotidiano de nobre endinheirado. Não está interessado em pisar novamente na África. É aí que entra em cena o militar, político e jornalista americano George Washington Williams (Samuel L. Jackson), que está em Londres para denunciar as atrocidades que estão sendo cometidas pelos belgas no Congo. Ele faz amizade com Lord Clayton e o convence a retornar para a África e ajudar seus amigos congoleses. Mas assim que pisam na vila Kuba, o trio – sim, Jane não poderia ficar de fora dessa aventura! – vira alvo do ardiloso capitão Rom. Jane é sequestrada e corre perigos iminentes. Enfurecido, Lord Clayton volta a ser o temido Tarzan e fará o impossível para resgatar sua amada, usando sua força e seu talento para interagir com os animais selvagens. E contará com a ajuda do corajoso George Washington Williams, é claro!
        A Lenda de Tarzan é o típico produto comercial realizado para ser um arrasa-quarteirão. Traz um elenco estrelado, com destaque para Samuel L. Jackson, que dá vida a George Washington Williams, um personagem real da história americana, retratado no filme com certos exageros. A estampa poderosa de Djimon Hounsou também agrega carisma ao filme, assim como Christoph Waltz, que convence como vilão. A bela Margot Robbie, bem... Ela ofusca a tela sempre que está em cena! Quanto ao sueco Alexander Skarsgård, vestiu à perfeição os trajes do lendário homem-macaco.
        O diretor David Yates conseguiu trazer uma dimensão épica para o filme, talvez calejado pelos resultados que alcançou à frente dos quatro últimos filmes da franquia Harry Potter. Esbaldou-se com as peripécias da computação gráfica que conseguiu enfiar cena após cena e também soube desenvolver o lado romântico da história. Explorou inclusive o forte apelo sensual que irradia do envolvimento entre a bela e fera, mas sem se desviar do entretenimento voltado para o público familiar.
        O roteiro de A Lenda de Tarzan é assinado por Craig Brewer e Adam Cozad. Os dois foram convocados para desenvolver a história em competição e acabaram trazendo elementos que deram novo fôlego à história concebida por Edgar Rice Burroughs. O tratamento final é uma peça costurada com competência. Segue uma narrativa linear, com cenas expositivas bem dosadas e usa os flashbacks com sabedoria, para destacar a origem dos personagens – por certo os momentos mais emocionantes da história.
        O filme funciona muito bem. É um espetáculo esquecível? Sim! Mas tem cinema suficiente para prender a atenção do começo ao fim. Faz justiça ao personagem centenário que está presente na cultura popular por gerações e ainda tem fôlego para continuar mexendo com a nossa imaginação.

Resenha crítica do filme A Lenda de Tarzan

Título original: The Legend of Tarzan
Ano de produção: 2016
Direção: David Yates
Roteiro: Adam Cozad e Craig Brewer
Elenco: Alexander Skarsgård, Rory J. Saper, Christian Stevens, Christoph Waltz, Samuel L. Jackson, Margot Robbie, Djimon Hounsou, Jim Broadbent, Casper Crump, Ben Chaplin, Hadley Fraser, Genevieve O'Reilly, Yule Masiteng, Mimi Ndiweni e Simon Russell Beale

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