Cidade de Deus: dramatizando um compilado de histórias verdadeiras

Cena do filme Cidade de Deus
Cidade de Deus: filme dirigido por Fernando Meirelles

UM BOM NARRADOR. É TUDO O QUE PRECISAMOS PARA COMPRAR UMA HISTÓRIA

Cidade de Deus nasceu livro. Paulo Lins o escreveu na condição de morador da favela que fica na Zona Oeste do Rio de Janeiro e lhe emprestou o nome para usar no título. É uma obra de valor literário, que narra centenas de histórias reais, que aconteceram com um incontável número de personagens. Então, pelas mãos de Fernando Meirelles, virou filme. E que filme! Essa produção de 2002 está, seguramente, entre os melhores filmes brasileiros de todos os tempos.
        A trama se atém às décadas de 60 e 70 e narra o nascimento da favela juntamente com o do crime organizado, movido pelo narcotráfico. Para contar essa trajetória, Meirelles escolheu algumas das histórias narradas no livro e incumbiu o roteirista Bráulio Mantovani de costurar um roteiro viável. Acontece que ter boas histórias para contar, sobre fatos surpreendentes que aconteceram com personagens marcantes, não é garantia de sucesso. Depois de incontáveis tratamentos, conseguiu estruturar uma narrativa ágil e envolvente.
        O pulo do gato de Mantovani foi saber escolher o narrador certo para suas histórias. Em meio a tanta bandidagem, tanta moral torta, Buscapé é o único a quem estenderíamos a mão, permitindo que nos guiasse por todo o filme. Em Cidade de Deus, Fernando Meirelles soube dar voz ao personagem íntegro, mas vulnerável, que gosta de fotografia, mas tem alma de narrador. É por ele que torcemos desde a primeira cena, quando se envolve numa situação potencialmente mortal. E continuamos assim até o ápice do filme, quando já estamos arrebatados por uma poderosa força dramática e voltamos ao início.
        Buscapé foi esculpido por Mantovani, mas a pedra bruta que lhe deu vida veio inteira do livro de Paulo Lins. Ao redor dele, Fernando Meirelles construiu um filme memorável. Escancarado sem ser graficamente sanguinário. Salpicado aqui e ali com pitadas de humor. A linguagem usada pelo diretor acabou tendo forte influência estética em toda a nossa mídia. Depois de Cidade de Deus as novelas mudaram, os comerciais de TV mudaram, o rádio, os jornais... A linguagem audiovisual do brasileiro mudou!
        Cidade de Deus é cinema criativo, inteligente e artisticamente relevante. Em sua busca por autenticidade, Meirelles optou por utilizar um elenco composto principalmente por amadores sem experiência diante das câmeras. Foram garimpados depois de um longo período de oficinas de teatro, realizadas nas localidades onde filme foi rodado. Convenceu! Os jovens e crianças recrutados por esse... filme organizado, foram responsáveis inclusive pela versão final dos diálogos. Nessa tarefa, Meirelles contou com a colaboração de Kátia Lund, creditada como codiretora.
        O filme participou da festa do Óscar depois de receber quatro indicações, nas categorias de melhor diretor, melhor roteiro adaptado, melhor edição e melhor fotografia. Saiu sem estatuetas. Não fizeram falta!

Resenha crítica do filme Cidade de Deus

Data de produção: 2002
Direção: Fernando Meirelles
Roteiro: Bráulio Mantovani
Elenco: Alexandre Rodrigues, Leandro Firmino da Hora, Phellipe Haagensen, Douglas Silva, Jonathan Haagensen, Matheus Nachtergaele, Seu Jorge e Alice Braga

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