Dunkirk: uma batalha dramática no início da Segunda Guerra Mundial

Cena do filme Dunkirk
Dunkirk: filme dirigido por Christopher Nolan

PERSONAGENS FICTÍCIOS E SITUAÇÕES PROVÁVEIS EM FATOS VERDADEIROS

Imagino o ecran como um portal dimensional, ligando o universo da arte audiovisual ao mundo real do espectador acomodado na poltrona. No escuro da sala de cinema, a telona tem uma aura de magia, praticada para enfeitiçar plateias. Já nas salas de estar, as telinhas se prestam a diversões adicionais: música, esportes, reality shows, novelas, desenhos animados... Cinema e televisão são dois portais diferentes, ainda que as tecnologias de hoje igualem as experiências sensoriais – as imagens dos aparelhos de TV estão cada vez mais incríveis! Muitos espectadores já não se importam em qual plataforma assistirão aos seus filmes e muitos diretores estão filmando para serem vistos até mesmo nos celulares. Ainda assim, continuo firme na minha convicção: há coisas que só o cinema feito para as telonas é capaz de ousar!
        Dunkirk, filme de 2017 dirigido por Christopher Nolan é um ótimo exemplo para ilustrar esse ponto. Trata-se de uma produção milionária, planejada e executada em escala industrial, concebida como uma façanha cinematográfica. É claro que pode ser apreciado no conforto de casa, por meio dos serviços de streaming, sem prejuízos ao seu conteúdo dramático. Mas a estética realista e o caráter imersivo da obra ficam mais disponíveis nas salas de exibição. É lá que o espectador encontra a justificativa para que esse tipo de filme continue sendo produzido.
        O que vemos retratado nesse filme é um dos episódios mais dramáticos da Segunda Guerra Mundial, em que os aliados saem derrotados e os americanos não são os mocinhos – aliás, os americanos ainda nem haviam embarcado na guerra. As forças britânicas foram empurradas para o norte da França por uma divisão alemã e terminaram encurraladas na região costeira próximo a Calais. Mais de 300 mil soldados precisaram ser evacuados pelo Canal da Mancha. Sem navios suficientes, Churchill apelou aos cidadãos comuns, que se lançaram ao mar em pequenas embarcações para buscar seus filhos.
        O filme mostra o episódio por três perspectivas distintas, cobrindo três linhas narrativas que se misturam e se cruzam no ato final. Na primeira, vemos o Sr. Dawson (Mark Rylance) um cidadão britânico comum, dono de um veleiro, que toma para si a missão de resgatar os soldados que conseguir. Na segunda narrativa, seguimos Farrier (Tom Hardy), um piloto da RAF que luta contra os caças alemães e vê os níveis de combustível do seu Spitfire caírem rápido demais. Na terceira narrativa, acompanhamos o drama de Tommy (Fionn Whitehead), um soldado britânico que tenta sobreviver a todo custo, vagando por entre as tropas acuadas e contando com a sorte para conseguir se safar de incontáveis perigos.
        A evacuação de Dunquerque já havia sido mencionada em produções recentes, mas Christopher Nolan tocou no assunto com propriedade. Fugiu à tentação de abraçar a linguagem do documentário e alcançou uma verdade emocional apenas revelada pela arte da dramatização. Ao preferir mostrar a desorientação e o despreparo, tanto dos combatentes como da população, seu filme resultou intenso e eivado de tensão. Não ficamos com os horrores das batalhas sanguinárias, mas com o medo e a perplexidade, misturados com a certeza de que os piores imprevistos podem acontecer. Então, surgem os atos de heroísmo, de desespero, de humanidade... Dunkirk está entre os maiores dramas de guerra já filmados.
        O filme foi inteiramente concebido na mente do diretor, quando fez uma viagem de barco pelo Canal da Mancha nos anos 1990, na companhia da mulher e de um colega de faculdade, quando passaram 19 horas lutando contra o mar em fúria. Logo imaginou a dimensão do drama real que se tornou a evacuação de Dunquerque. Para contá-lo, planejou um filme lacônico, com pouquíssimas linhas de diálogo. Sua ideia inicial foi a de não partir de um roteiro estruturado, mas gerar o filme ao longo das filmagens. É claro que precisou voltar atrás, dada a complexidade que a produção assumiu e o montante de investimentos que precisou captar. Ainda assim, o roteiro que concebeu ficou bastante enxuto – apenas 76 páginas!
        Antes de realizar Dunkirk, Christopher Nolan fez a lição de casa: pediu conselhos ao seu amigo Steven Spielberg, que lhe emprestou uma cópia das cenas originais captadas para o filme O Resgate do Soldado Ryan. Isso o ajudou a encontrar uma maneira de lidar com as cenas violentas, sem abrir mão do realismo e do impacto emocional. A produção superlativa também acabou se tornando um grande diferencial, já que a quantidade de extras exigiu a confecção de uniformes, botas e acessórios numa escala inédita, mesmo para os padrões das grandes produções. Maquetes de embarcações, veículos e armamentos também enchem a tela e contribuem para o realismo das cenas.
        Nada de Winston Churchill fumando charutos, generais em salas de guerra, políticos disputando protagonismo ou tropas entrando em combates ferozes. Em Dunkirk somos transportados para o começo da Segunda Guerra Mundial, junto com soldados que lutam pela sobrevivência. As cenas captadas lá mesmo, em Dunquerque, que ainda hoje esconde munições não detonadas enterradas na areia, são tensas e dramáticas. Funcionam como uma espécie de prenúncio do horror que a humanidade viveria por imposição dos regimes fascistas.

Resenha crítica do filme Dunkirk

Data de produção: 2017
Direção: Christopher Nolan
Roteiro: Christopher Nolan
Elenco: Fionn Whitehead, Tom Glynn-Carney, Jack Lowden, Harry Styles, Aneurin Barnard, James D'Arcy, Barry Keoghan, Kenneth Branagh, Cillian Murphy, Mark Rylance e Tom Hardy

Comentários

Postar um comentário

Confira também:

Tempestade Infinita: drama real de resiliência e superação

Menina de Ouro: a história de Maggie Fitzgerald é real?

Siga a Crônica de Cinema