O Silêncio dos Inocentes: um psiquiatra culto, refinado, sedutor e... canibal

Cena do filme O Silêncio dos Inocentes
O Silêncio dos Inocentes: filme dirigido por Jonathan Demme

UM DOS FILMES MAIS EMBLEMÁTICOS DOS ANOS 1990

Nos grandes filmes, as forças narrativas devem estar equilibradas: metade áudio, metade visual. O cineasta precisa ter refinamento artístico e domínio da expressão gráfica, para capturar os planos certos, posicionar a câmera na distância necessária e lidar com a luz  – ou a ausência dela. Porém, se esquecer do universo sonoro, jamais conseguirá criar a atmosfera adequada para conduzir as emoções do espectador. Em Hollywood, um dos cineastas que reunia qualificações nas duas áreas era Jonathan Demme – além de comédias dramáticas ele filmou vários espetáculos musicais. Seu filme de 1991, O Silêncio dos Inocentes, acabou se tornando um dos mais emblemáticos daquela década.
        Quando se fala em O Silêncio dos Inocentes, o primeiro nome que vem à mente é Hannibal Lecter, mas o de Clarice Starling tem que ser pronunciado imediatamente na sequência. Thomas Harris criou ambos os personagens. Ele, o psiquiatra culto, refinado, inteligente, sedutor e... canibal, que se tornou um assassino em série. Ela, uma agente novata do FBI, com feições assustadas e porte tão frágil que denunciam sua inexperiência e vulnerabilidade. A interação entre ambos é o elemento que sustenta o clima de suspense da história e faz o espectador roer as unhas.
        Os outros nomes que associamos ao filme são os de Anthony Hopkins e Jodie Foster, interpretes dos personagens, mas falar deles agora é sair do plano da ficção. Vamos deixá-los para mais adiante e lembrar da sinopse: Clarice Starling é destacada pelo supervisor do FBI Jack Crawford (Scott Glenn) para interrogar o assustador Dr. Hannibal Lecter numa prisão de segurança máxima. Ela não sabe, mas na verdade está lá para conseguir a colaboração voluntária do psiquiatra, descobrindo pistas que os ajudem a resolver o caso de um psicopata conhecido como Buffalo Bill (Ted Levine), que está cometendo crimes em série. A vítima mais recente, filha de uma senadora, está sendo mantida em cativeiro. Dr. Lecter aceita colaborar, mas faz exigências. Clarice consegue informações, mas se expõe emocionalmente, aceitando ser terapeutizada e revelando segredos íntimos de sua infância, num jogo arriscado e perigoso. Além disso, a urgência em resgatar a refém abre para o Dr. Lecter uma oportunidade de fugir da prisão.
        Thomas Harris, autor familiarizado com o universo policial e seus processos de investigação, tem notáveis habilidades literárias. Criou o Dr. Hannibal Lecter em 1981 no seu livro Dragão Vermelho e fez dele um personagem marcante, que assumiu lugar entre os maiores vilões da ficção. Também atiçou a criatividade dos produtores de Hollywood e se tornou um enorme sucesso – outros três romances vieram na sequência, para deleite dos fãs. Já o cinema primeiro conheceu o Dr. Hannibal Lecter no filme Caçador de Assassinos, produção de 1986 escrita e dirigida por Michael Mann, que se baseou no livro Dragão Vermelho – lá o psiquiatra canibal era um personagem secundário e apareceu em duas cenas, com o nome de Lector.
        Foi O Silêncio dos Inocentes que revelou a criação de Thomas Harris para o grande púbico. A adaptação para o cinema foi escrita pelo roteirista Ted Tally, que conhecia muito bem o livro – recebeu do autor uma cópia antecipada em 1987, um ano antes que fosse lançado. Nas páginas do romance, a história fluía em suspense e tensão, mas no roteiro, as regras estabelecidas para os thrillers estavam sendo perigosamente quebradas. Não havia cenas de ação nos dois primeiros atos, nem perseguições, tiros ou lutas. Além disso, a heroína frágil nem sequer corria perigo físico. Para complicar, não havia nenhum ponto de virada surpreendente no final do terceiro ato.
        Mas havia a performance incrível dos dois atores, cuja hora de comentar aqui nessa crônica finalmente chegou! Para começar a falar deles é mais fácil mencionar o depoimento do diretor Jonathan Demme em uma entrevista: ele lembra que haviam programado cenas que seriam apresentadas como flashbacks, mostrando Clarice vivendo o episódio da infância em que se envolve com os tais cordeiros do título original em inglês (The Silence of the Lambs). Porém, quando os realizadores viram o desempenho de Antony Hopkins e Jodie Foster na cena gravada, simplesmente cancelaram. Já estava tudo lá, as emoções, os gestos as expressões, o tom de voz... Mostrar, regra básica do cinema, seria redundante.
        Apenas com o olhar, Anthony Hopkins conseguiu sintetizar a alma de Hannibal Lecter. Suas expressões gélidas e sua voz perturbadora deram vida ao personagem, irradiando na plateia sentimentos de puro medo e terror. A Clarice de Jodie Foster arranca empatia desde o primeiro instante em que aparece em cena, então, tudo o que queremos é acompanha-la até o final da história. É claro que a escolha dos planos, os closes na hora certa, o uso da câmera subjetiva e a escolha da trilha sonora de arrepiar são elementos essenciais, cujos méritos ficam com o diretor.
        O Silêncio dos Inocentes foi um rolo compressor: arrematou os cinco óscares mais importantes: melhor filme, melhor diretor, melhor ator, melhor atriz e melhor roteiro adaptado. A história ainda hoje continua causando arrepios.

Resenha crítica do filme O Silêncio dos Inocentes

Ano de produção: 1991
Direção: Jonathan Demme
Roteiro: Ted Tally
Elenco:Jodie Foster, Anthony Hopkins, Scott Glenn, Ted Levine, Anthony Heald, Brooke Smith, Masha Skorobogatov, Kasi Lemmons, Frankie Faison, Diane Baker, Tracey Walter, Charles Napier,Danny Darst, Ales Coleman, Dan Butler, Paul Lazar, Ron Vawter, Roger Corman, George A. Romero, Chris Isaak, Harry Northup e Brent Hinkley

Comentários

  1. Bom dia Fabio, cada vez que leio seus comentários, me dou conta de muito pouco entendo de cinema. Mas sigo aprendendo. Boa semana…

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    1. Olá, Julio. Tenho pesquisado bastante na internet. Para cada crônica reúno várias informações, seguindo os temas que me interessam. Tenho aprendido muito nesse processo. Boa semana!

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  2. Também penso como o Julio . sempre aprendendo com você Fábio

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