A Batalha das Correntes: uma história real e... eletrizante!

Cena do filme A Batalha das Correntes
A Batalha das Correntes: filme de Alfonso Gomez-Rejon

COMO THOMAS EDISON E GEORGE WESTIGHOUSE FUNDARAM O MUNDO MODERNO

A Batalha das Correntes, filme de 2019 dirigido por Alfonso Gomez-Rejon, é um drama baseado em fatos. Narra a épica disputa entre Thomas Edison e George Westinghouse para criar e dominar o mercado da eletricidade nos Estados Unidos, nas últimas décadas do Século XIX. Foi uma corrida que ajudou a moldar o mundo como o conhecemos hoje, mas antes de falar sobre ela, ou sobre as qualidades da produção, quero tocar num assunto complexo: o título do filme!
        Em Portugal o filme virou Guerra das Correntes, enquanto aqui no Brasil foi batizado de A Batalha das Correntes – ganhou um desnecessário artigo e ainda teve seu alcance reduzido, já que uma batalha está longe denotar o que foi uma guerra inteira. Ambos os títulos foram criados com a clara intenção de manter o paralelo com o original: The Current War. Mas há uma sutileza que escapou aos “tradutores”. Em português, o vocábulo “current” pode ser traduzido por “corrente”, mas tem também a acepção de “atual”. Aliás, acontece o mesmo no nosso idioma! Se os tradutores se agarrassem ao pé da letra e batizassem o filme de A Guerra Corrente, poderíamos compreender também que se trata de uma guerra atual, que continua sendo travada correntemente, mantendo ainda o trocadilho com o conceito de “corrente elétrica”. Por outro lado, referindo-se às correntes, no plural, nós lusófonos levamos a vantagem de deixar claro que há duas correntes na disputa: a alternada defendida por Westinghouse e a contínua, por Edison.
        Peço desculpas pelo preciosismo, que pode ter soado aborrecido para os cinéfilos interessados em ir direto ao filme, mas considerei oportuno tocar no assunto com certa pompa, pois é esse mesmo o espírito dessa produção. Ela nos transporta para um momento crucial da nossa civilização, quando nos livramos da ditadura da escuridão noturna e caminhamos para a luz do capitalismo empreendedor, que impulsionou a nossa capacidade produtiva e nos lançou nesse mundo de alta tecnologia. Em A Batalha das Correntes acompanhamos homens de fraque e cartola usando código Morse para se comunicar ao telégrafo, enquanto as primeiras lâmpadas ainda brilhavam pálidas nas feiras e exposições, para satisfazer a curiosidade dos visitantes.
        O filme abre em 1880, quando Thomas Edison (Benedict Cumberbatch) apresentou a lâmpada elétrica aos americanos. Ambicioso, visualizou um futuro onde comandaria a eletrificação das cidades usando corrente contínua. Simultaneamente, George Westinghouse (Michael Shannon) sonha com as mesmas conquistas, mas usando a corrente alternada, economicamente mais viável. Edison é um predador voraz, tem a mídia a seu favor e é capaz de jogar sujo para ganhar território. Westinghouse é um idealista e toma suas decisões com base em princípio éticos e sólidos valores morais. Nessa guerra há espaço até mesmo para o inventor Nikola Tesla (Nicholas Hoult) dar suas cartadas e tentar ganhar nacos do mercado. Enquanto acompanhamos a trama, para ver quem será o senhor da eletrificação, vemos as outras invenções de Edison, o fonógrafo e o cinematógrafo, transformando o mundo da água para o vinho.
        A Batalha das Correntes foi uma concepção do roteirista Michael Mitnick, que começou a escrevê-lo em 2008. Inicialmente, a ideia era produzir um musical, mas sessenta rascunhos depois e com o ingresso de financiamentos, virou filme. O roteirista fez uma pesquisa minuciosa, consultando documentos em museus, jornais, livros de domínio público, biografias dos personagens e até mesmo um diário mantido pelo próprio Thomas Edison. Como resultado, Mitnick chegou a um retrato bastante completo dos dois protagonistas dessa guerra para fundar o mundo moderno.
        É claro que os iniciados no mundo da eletricidade saberão apreciar melhor os desdobramentos da trama. Quem conhece um pouco de física, sabe a diferença entre os dois tipos de corrente, entende o comportamento da eletricidade e faz ideia do que seja um dínamo ou um transformador, vai se sentir em casa. Quem compreende o alcance histórico das conquistas empreendidas pelos personagens poderá visualizar em quais territórios os dois homens estão lutando. O roteiro de Michael Mitnick toma o cuidado de manter o expectador bem informado, com linhas de diálogo explicativas na medida certa. Além disso, Benedict Cumberbatch e Michael Shannon fizeram a sua parte, entregando excelentes atuações.
        Embora o tema seja complexo demais e árido para muitos espectadores, A Batalha das Correntes segue num ritmo ágil e envolvente. Méritos do diretor Alfonso Gomez-Rejon, que já havia realizado o filme Eu, Você e a Garota Que Vai Morrer, uma produção orbitando o universo dos adolescentes. Aqui ele parece falar com o mesmo público, porém num tom mais didático, ao usar uma estética moderna para abordar fatos que viviam trancafiados nos livros de história. Inclusive, a presença de Tom Holland no papel de Samuel Insull, assistente de Edison, é uma clara tentativa de aproximação com o público jovem.
        Não posso negar que ao longo dos 107 minutos do filme deixei fluir o meu lado nerd e embarquei entusiasmado nessa história. Além disso, para nós, os amantes do cinema, Thomas Edison é um personagem central. Não apenas por ter inventado o cinematógrafo, mas por ter patenteado sua invenção e passado a cobrar royalties de quem se atrevesse a produzir um filme. Aqueles que não queriam pagar fugiram para bem longe, onde não podiam ser alcançados por seus cobradores. Foram parar na Califórnia. Em Los Angeles. Fundaram Hollywood! Não resta dúvidas de que, para o bem ou para o mal, o inventor da lâmpada elétrica ajudou a construir o mundo no qual vivemos.

Resenha crítica do filme A Batalha das Correntes

Ano de produção: 2019
Direção: Alfonso Gomez-Rejon
Roteiro: Michael Mitnick
Elenco: Benedict Cumberbatch, Michael Shannon, Nicholas Hoult, Katherine Waterston, Tom Holland, Simon Manyonda, Stanley Townsend, Tuppence Middleton, Matthew Macfadyen, Conor MacNeill, Damien Molony, John Schwab, Louis Ashbourne Serkis e Corey Johnson

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