Distrito 9: ação e suspense numa ficção científica provocativa


Cena do filme Distrito 9
Distrito 9: filme dirigido por Neill Blomkamp

UMA DISTOPIA INTELIGENTE FILMADA COM REALISMO PERTURBADOR

Em 2005, o cineasta Neill Blomkamp pôs em prática o que aprendeu na Vancouver Film School e realizou um curta-metragem de seis minutos, intitulado Alive in Joburg. Era ficção científica na veia, filmado em Joanesburgo, na África do Sul, cidade natal de Blomkamp. Explorava temas ao redor do regime de apartheid, combinando uma linguagem documental com efeitos visuais realistas. Mostrava como refugiados alienígenas, vindos do espaço, estavam disputando território e recursos com a população empobrecida da cidade, despertando medo, ódio e fúria xenófoba. Uma metáfora provocativa que ganhou a internet e alavancou a carreira do cineasta.
        Por uma conjunção de fatores comerciais, Neill Blomkamp se viu novamente diante do tema em 2009, dessa vez para rodar o filme Distrito 9, uma adaptação daquele seu curta. Juntou-se à sua colega Terri Tatchell e escreveram o roteiro, expandindo as ideias originais. Criaram um enredo consistente, desenvolveram os personagens e acrescentaram elementos de suspense e ação. Muita ação! Mas o diretor não perdeu de vista a metáfora poderosa contida na ideia central do seu curta. Ao contrário, aproveitou os recursos da computação gráfica para levá-la a um nível inédito. Diante de um realismo desconcertante, o espectador se vê obrigado a confrontar as implicações do segregacionismo e do preconceito racial.
        Distrito 9 parte de uma premissa instigante para criar uma distopia: nos anos 1980, uma imensa nave espacial que dominou os céus de Joanesburgo, pairando em desafio à gravidade, ficou encalhada por razões técnicas. Quando os militares conseguiram entrar na nave, se depararam com uma população inteira de alienígenas artrópodes enfurnada nos porões, lutando para sobreviver. Eles são trazidos para o tal Distrito 9, apelidados de camarões e condenados a viver como refugiados. Confinados e cercados pela polícia, com o passar dos anos acabam transformando o campo de refugiados numa imensa favela.
        Agora, em pleno início do século XXI, os camarões precisam ser realocados para uma nova área, batizada de Distrito 10. Quem vai cumprir a ordem de despejo será Wikus van de Merwe (Sharlto Copley), um ambicioso burocrata africâner, empregado da corporação com poderes de polícia que foi nomeada pelo estado sul-africano para gerenciar a crise. É claro que lidar com quase dois milhões de alienígenas artrópodes isolados e segregados não será tarefa fácil. Alguns deles tramam uma ação evasiva, para se libertar do jugo dos terrestres e acabam envolvendo Wikus em uma situação aterradora: por obra de prodígios tecnológicos, ele passa a sofrer um processo de metamorfose, que poderá transformá-lo biologicamente em um alienígena. Para o protagonista, o sentido de urgência agora é outro. Terá que lutar pela própria vida.
        Tecnicamente, o filme Distrito 9 é um feito e tanto! O estilo documental que adota, combinado com efeitos realistas de computação gráfica, transportam o espectador para uma distopia inteligente. Mas o que explode em verossimilhança é a inspiração nos fatos históricos que marcaram a África do Sul durante o apartheid – houve de fato um distrito na Cidade do Cabo, o de número seis, quando mais de 60 mil pessoas foram removidas a força pela polícia, depois que o local passou a ser destinado apenas aos brancos.
        Ao aludir à história do seu país, o diretor Neill Blomkamp consegue um efeito dramático notável. A aparência abjeta dos alienígenas artrópodes e seus hábitos repugnantes causam no espectador uma reação inicial de repulsa e afastamento. Não são humanos! Porém, na medida em que as histórias dos indivíduos vão se sobrepondo, passamos a reconhecer nos camarões elementos que despertam empatia. Vemos como eles são injustiçados, como clamam por liberdade, por direitos... A polícia, as forças do estado e as corporações subvencionadas com dinheiro público são usadas para conter aquele coletivo de artrópodes numa condição de miséria lamentável. Quando nos damos conta, estamos torcendo para que os personagens alienígenas consigam vencer a maldade dos terráqueos. Da mesma forma, vemos como o desprezível Wikus, na medida em que se metamorfoseia em artrópode, vai ganhando contornos cada vez mais humanos.
        Sim, Distrito 9 é ficção científica na veia, mas também é um filme de ação em ritmo acelerado e contagiante, filmado com realismo perturbador. Fala da xenofobia que ironicamente une todas as etnias humanas, num sentimento de aversão e ódio contra uma espécie desumana – no sentido de não ser humana – para tratá-los como meros insetos. O filme foi indicado a quatro Óscars: melhor filme, melhor roteiro adaptado, melhores efeitos visuais e melhor edição. Saiu sem nenhuma estatueta. Kathryn Bigelow, com seu Guerra ao Terror e James Cameron, com seu Avatar estragaram a festa. Vejamos então como será a tão aguardada sequência a ser realizada pelo diretor Neill Blomkamp, já batizada como Distrito 10.

Resenha crítica do filme Distrito 9

Ano de produção: 2009
Direção: Neill Blomkamp
Roteiro: Neill Blomkamp e Terri Tatchell
Elenco: Sharlto Copley, Jason Copem, David James, Vanessa Haywood, Mandla Gaduka, Eugene Wanangwa Khumbanyiwa, Louis Minnaar, Kenneth Nkosi, William Allen Young, Nathalie Boltt, Sylvaine Strike, John Sumner, Nick Blake, Jed Brophy, Vittorio Leonardi, Johan van Schoor, Marian Hooman, Jonathan Taylor, Stella Steenkamp, Tim Gordon, Nick Boraine, Robert Hobbs, Trevor Coppola e Morne Erasmus

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