Decisão de Risco: um thriller eletrizante sobre a guerra de drones

Cena do filme Decisão de Risco
Decisão de Risco: filme de Gavin Hood

O DILEMA ÉTICO DA CADEIA DE COMANDO

Olhe em volta! Estamos entrando no último trimestre de 2022. A tecnologia digital não pára de nos surpreender, causando estrondosos impactos no nosso cotidiano. Com nossos celulares, somos mais rápidos, mais eficientes e conectados uns aos outros em tempo real. Quero, então, fazer uma provocação: se nós, cidadãos comuns, somos capazes de façanhas que eram inimagináveis 15 ou 20 anos atrás, calcule o poderio dos militares, que sempre se põem na vanguarda da tecnologia e a canalizam para uso bélico. Talvez já estejam lidando com conceitos que só vemos na ficção científica.
        No filme Decisão de Risco, dirigido em 2016 por Gavin Hood, temos um vislumbre do que acabou se tornando a guerra moderna, nas mãos dos militares e dos políticos. Mas é bom lembrar que esse thriller eletrizante começou a ser gestado em 2008, quando Guy Hibbert, por encomenda da BBC Films, iniciou suas pesquisas para escrever o roteiro. Já se vão 14 anos! É legítimo imaginar que as traquitanas mostradas talvez estejam superadas.
        Estou certo de que os exércitos modernos já podem atuar como forças de alta tecnologia, com contingentes menores, mais rápidos, mais eficazes e a custos reduzidos. Para o grande público, a única face visível dessa realidade é a da guerra de drones. Sabemos que há aeronaves não tripuladas riscando os céus, em missão de vigilância e combate, carregando inclusive armas letais. Tais drones são controlados remotamente, por soldados confortavelmente posicionados a dezenas de milhares de quilômetros do campo de batalha – e isso já foi objeto de vários filmes de guerra. Mas Decisão de Risco nos mostra um quadro mais detalhado dessa realidade, apresentando o conceito que os militares chamam de kill chain – numa tradução livre, algo como “cadeia assassina”. Basicamente, descreve o modo como todos os envolvidos numa operação de guerra, soldados, comandantes e políticos, recebem imagens em tempo real do campo de batalha em seus computadores e são instados a tomar decisões de vida ou morte, arcando com os inevitáveis dilemas éticos e morais implícitos.
        A sinopse de Decisão de Risco esmiúça um evento fictício, mas dramático. Uma operação secreta envolvendo britânicos, americanos e quenianos está em curso em Nairóbi, com o objetivo de capturar um grupo de terroristas recém convertidos ao islamismo radical. Quando o drone que sobrevoa a cidade consegue localizá-los, fica claro que estão na iminência de executar um atentado a bomba, utilizando jovens suicidas. A Coronel da inteligência britânica Katherine Powell (Helen Mirren) muda imediatamente o status da missão: agora o objetivo é matar os terroristas, disparando um poderoso míssil Hellfire por meio do drone. Porém, há toda uma cadeia de comando que precisa ser envolvida. Enquanto o General Frank Benson (Alan Rickman) faz a ponte com os advogados e políticos em Londres, surge um obstáculo inesperado. Alia (Aisha Takow), uma garotinha que mora na casa ao lado onde estão os terroristas, resolve vender pães encostada num muro, bem na área que será destruída pela explosão. O operador do drone, Steve Watts (Aaron Paul), não quer carregar o peso de matar uma criança inocente. Jama Farah (Barkhad Abdi), um agente keniano disfarçado, fará de tudo para retirar a menina do local. Mas a corrida agora é contra o relógio, porque os terroristas já estão prontos para o ataque e os militares no comando precisarão decidir se explodem a casa, apesar do possível dano colateral – a morte da pobre garotinha, que só quer vender seus pães.
        O roteirista Guy Hibbert é um veterano da televisão e do cinema. Experiente, entrevistou homens das forças armadas britânicas e conseguiu pôr no papel uma resenha fiel de todos os aparatos tecnológicos realmente usados pelos militares – inclusive o incrível drone inseto, que consegue entrar na casa dos terroristas e transmitir imagens ao vivo. Avaliando as implicações morais e éticas desses recursos, que estão mudando a face da guerra moderna, o roteirista conseguiu criar um enredo repleto de ganchos dramáticos. Criou personagens verossímeis, para apresentar os dilemas a partir de vários pontos de vista. Seu grande mérito foi o de não tentar induzir o espectador, deixando que faça seu juízo depois de se sentir na pele de cada um dos tomadores de decisões.
        O diretor Gavin Hood também traz vários filmes no currículo: Tsotsi, O Suspeito, X-Men Origins: Wolverine, Ender's Game – O Jogo do Exterminador e Segredos Oficiais. Empolgado com as qualidades do roteiro de Decisão de Risco, ele ingressou no projeto disposto valorizar a verossimilhança do enredo e estimular o debate em torno das questões éticas que levanta. Em colaboração com o roteirista, fez uma alteração importante: transformou o Coronel Powell numa personagem feminina, para ganhar mais densidade dramática e fugir dos clichês. Escalou Helen Mirren para o papel – não podia ter sido mais feliz! – e Alan Rickman, que fez sua última aparição nas telas como o general do exército britânico. Aaron Paul, que muitos conhecem da série Breaking Bad, vive um dos personagens mais tensos do filme, já que carrega o ônus de ter que apertar o gatilho no momento decisivo.
        Gavin Hood conta que as filmagens foram difíceis, pois todos os atores tiveram que ser filmados separadamente, valendo-se das inevitáveis telas verdes. Jamais se encontram nos sets. Isso de certa forma emulou o que de fato acontece nas guerras modernas, onde os comandantes e os comandados nem ao menos se conhecem. Apenas trocam informações frias pelos aplicativos de mensagens.
        O filme me fez refletir sobre o próximo nível desse verdadeiro videogame. Talvez já exista drones pequenos e ágeis o suficiente, para entrar nas casas de qualquer um e eliminar suas vítimas com diferentes tipos de armas. Talvez já exista centenas de drones insetos, zunindo vigilantes pelas cidades, policiando nossos comportamentos a mando dos políticos. Talvez já exista drones capazes de nos flagrar no cotidiano e desvendar todos os nossos segredos. Os realizadores de Decisão de Risco fizeram muito bem em nos alertar, para que possamos debater as implicações éticas e morais de tão bizarro estado de coisas!

Resenha crítica do filme Decisão de Risco

Título original: Eye in the Sky
Título em Portugal: Operação Eye in the Sky
Ano de produção: 2016
Direção: Gavin Hood
Roteiro: Guy Hibbert
Elenco: Helen Mirren, Alan Rickman, Aaron Paul, John Heffernan, Babou Ceesay, Carl Beukes, Jeremy Northam, Iain Glen, Monica Dolan, Richard McCabe, Phoebe Fox, Lemogang Tsipa, Kim Engelbrecht, Gavin Hood, Michael O'Keefe, Laila Robins, Vusi Kunene, Barkhad Abdi, Lex King, Warren Masemola, Ebby Weyime, Armaan Haggio, Aisha Takow e Vusi Kunene

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