Sinais: suspense à moda antiga

Cena do filme Sinais
Sinais: direção de M. Night Shyamalan

SUSPENSE COM ABORDAGEM TRADICIONAL, MAS ELETRIZANTE

De certa forma, o espectador já sabe o que esperar de um filme de M. Night Shyamalan: suspense, temas sobrenaturais e uma reviravolta ao final da trama, com capacidade para surpreender até os mais atentos na plateia. Fez isso em O Sexto Sentido e conquistou a fama de herdeiro de Hitchcock, como rei do suspense. Em seu filme de 2002, Sinais, o diretor parece levar a sério tal honraria. Logo na abertura, lança mão de uma trilha sonora de impacto, criada por James Newton Howard, bem ao estilo daquelas compostas por Bernard Herrmann para o filme Psicose. Tal ardil surte efeito: o espectador agora é pura expectativa! Porém, não é o sobrenatural que inunda a atmosfera de mistério. O que nos faz contorcer na poltrona é a possibilidade de uma invasão extraterrestre com implicações apocalípticas.
        Segundo Shyamalan, a ideia para o filme nasceu quando imaginou o susto de uma família de fazendeiros ao encontrar na plantação um daqueles misteriosos círculos, que surgem sem explicação da noite para o dia. Juntou a vontade de realizar um filme sobre invasão alienígena e partiu para escrever um roteiro. Acontece que o diretor é um exímio contador de histórias e sabe como temperá-las com elementos de drama, para adicionar dimensões mais emocionantes. Sua especialidade é criar ótimos personagens e ver como eles reagem às circunstâncias extremas que os obrigará a enfrentar. Mas nesse ponto, é melhor comentar a sinopse de Sinais, para poder desenvolver melhor o meu ponto de vista:
        O filme nos conta a história de Graham Hess (Mel Gibson), um ex-padre da igreja anglicana, que vive em uma fazenda com um casal de filhos pequenos. Morgan (Rory Culkin) é um pré-adolescente inteligente, que sofre de asma. Bo (Abigail Breslin) é uma adorável garotinha vivaz de cinco anos. O irmão de Graham, Merril (Joaquin Phoenix), também vive na fazenda, depois de uma fracassada tentativa de se tornar um jogador de beisebol. Graham tem um forte motivo para ter abandonado a igreja e perdido completamente a fé em Deus: a morte da esposa em circunstâncias trágicas. A vida tranquila na fazenda termina quando se deparam com o tal círculo no milharal, que só pode ser sido obra de baderneiros desocupados. Tentam localizar os invasores e entregá-los para as autoridades. No entanto, atônitos, descobrem que os círculos nas plantações estão por todo o planeta e são os sinais de uma invasão alienígena em curso. Pela TV, acompanharão o evento que rapidamente ganha escala global, enquanto tentam defender a sua propriedade dos misteriosos seres vindos de algum outro planeta. O ex-padre, descrente de tudo, terá que encontrar forças em sua própria condição humana para proteger sua família.
        Os misteriosos círculos nas plantações já serviram de tema para incontáveis reality shows na TV, sempre especulando sobre sua origem extraterrestre. De fato, alguns desenhos são impressionantes quando vistos de cima e são complexos o suficiente para mexer com a imaginação do público. Sua natureza extraterrestre já foi desmentida, quando uma dupla de fazendeiros confessou a autoria, usando cordas e pranchas de acordo com uma técnica antiga. Porém, foram desacreditados, quando pesquisadores e ufólogos provaram que em alguns desenhos o resultado é diferente – as plantas não são pisoteadas, mas sim dobradas por alguma força desconhecida. O mistério permanece, cultivado e mantido pela mídia, certamente para continuar rendendo os bons níveis de audiência. Mas o fato é que, por si só, os tais círculos nas plantações jamais renderiam um drama digno de ser tratado em um bom filme de suspense. É aí que entra a mágica de M. Night Shyamalan.
        O que o diretor nos entrega é um drama sobre a perda da fé, justamente num momento em que ela será mais demandada. O protagonista, que a todo instante precisa lembrar às pessoas de que não é mais um padre, é puro ressentimento. Traz a recente perda da esposa como uma ferida incurável e percebe que, diante de uma terrível revelação, não tem nada em que se agarrar. Vê, pela TV, as crenças religiosas da humanidade se diluírem num caldo de confusão, com a chegada de seres que não deveriam existir. O diretor vai direto ao ponto: se de fato acontecer, um tal evento terá implicações religiosas para toda a humanidade.
        O cinema que Shyamalan nos apresenta em Sinais é conservador, agarrado às tradições do gênero, mas por isso mesmo eficiente. Está mais interessado em cutucar a imaginação do espectador do que apresentar truques de computação gráfica. Os temidos ETs ganham pouco espaço na tela, mas estão presentes de forma maciça, em incontáveis simbologias visuais. O universo sonoro do filme, aliás, é um dos seus pontos mais notáveis. O diretor conduz nossas emoções por meio de uma gama infindável de truques de sonoplastia, elaborados com maestria. O tom documental dos programas de TV aos quais os personagens assistem também funciona. Eles não cumprem apenas função expositiva no roteiro, mas ajudam a cultivar o medo e a expectativa.
        Por meio do filme Sinais, temos a oportunidade de acompanhar o que seria um evento em escala global, visto pelo prisma de uma família trancada em casa – no caso, uma fazenda. De certa forma, todos pudemos experimentar um pouco disso com a eclosão da recente pandemia de COVID19. Sabemos, por experiência própria, como é angustiante ter que acompanhar tudo pela TV! Revisitei o filme esta semana e fiquei impressionado com o desempenho do elenco infantil. Os astros Mel Gibson e Joaquin Phoenix estão ótimos, mas as crianças também convencem. O garoto Rory Culkin tem os olhos inteligentes e amedrontados e a pequena Abigail Breslin, bem... está adorável. Transborda aqui a mesma ingenuidade que veríamos anos depois no filme Pequena Miss Sunshine.

Resenha crítica do filme Sinais

Título original: Signs
Ano de produção: 2002
Direção: M. Night Shyamalan
Roteiro: M. Night Shyamalan
Elenco: Mel Gibson, Joaquin Phoenix, Rory Culkin, Abigail Breslin, Cherry Jones, M. Night Shyamalan, Patricia Kalember, Ted Sutton, Merritt Wever, Lanny Flaherty, Marion McCorry, Michael Showalter e Clifford David

Comentários

  1. Olha ! A menininha de tantos filmes muito bons. Não assisti ao filme aqui comentado, Sinais, mas está anotado para eu ver.
    Obrigada pela excelente crítica.

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