Dredd: juiz, mas também policial, promotor, júri e carrasco
Dredd: filme dirigido por Pete Travis
UM SISTEMA INFECTADO DE CINISMO E HIPOCRISIA
Para escrever sobre o ótimo Dredd, filme de ação e ficção científica com estética cyberpunk, dirigido em 2012 por Pete Travis, quero falar de... pragmatismo! Baseado na história em quadrinhos criada em 1977 por John Wagner e Carlos Ezquerra e publicada na revista inglesa 2000 AD, o filme mantém a essência do protagonista, que combate o crime em Mega City One, uma megalópole distópica incrivelmente violenta. Lá, o tal Juiz Dredd exerce as funções de policial, promotor, juiz, júri e carrasco, tudo ao mesmo tempo. Sim, ele e seus colegas juízes, que estão na rua para impor a lei e a ordem, agilizam o processo. Ganham tempo e poupam os recursos dos pagadores de impostos. São legitimados por um sistema pragmático, desenhado pelos detentores do poder para garantir resultados palpáveis, medidos estatisticamente.Quando comecei a frequentar os bancos da universidade, meus professores logo me esclareceram sobre o que é ser pragmático: é ser prático, focado em seus objetivos. É ser lógico e adotar as ideias que efetivamente resolvem os problemas imediatos. É só querer saber do que pode dar certo – já que não há tempo a perder!
Pragmatismo virou sinônimo de praticidade. Ser pragmático era ser sensato e realista. Bastava desbastar os espinhos de uma questão, para desfrutar o sumo saboroso da solução mais vantajosa. E segui feliz com esse pensamento filosófico, até que comecei a sentir o cheiro forte do oportunismo! Percebi que tomar o valor prático das minhas ações como critério para estabelecer a verdade é... desonesto! Compreendi que o pragmatismo é o exato oposto do intelectualismo. Não passa de um contorno tático, enquanto o pragmático segue com sua estratégia rumo a um fim que justifica todos os meios. A verdade sempre fica pelo caminho, e se quiser estar ao lado dela, terá que voltar atrás. Ser pragmático, afinal, revelou seu parentesco com o cinismo e a hipocrisia.
Na história em quadrinhos de Wagner e Ezquerra, o poder absoluto dado aos juízes resultou na sensação de que a justiça era feita, na escala demandada por uma sociedade inflada de violência e impessoalidade. Mas qual justiça? A que custo para os direitos individuais? Como evitar os desvios da regra? Como impedir a multiplicação de prerrogativas? Por puro pragmatismo, os cidadãos de Mega City One preferiram contornar essas questões, o que rendeu material dramático para que os autores costurassem suas histórias com muita violência, intrigas e conspirações. A distopia que eles criaram, ainda que carente de verossimilhança, atiçou a imaginação dos leitores e conquistou uma legião de fãs no mundo inteiro.
Sylvester Stallone, quando estrelou o filme O Juiz, em 1995, conseguiu irritar todos eles! A tola adaptação para o cinema veio um tanto... pragmática. Foi voltada para um público mais jovem e atenuou a exposição da violência. Ressaltou a pirotecnia tecnológica e submeteu a caracterização do protagonista aos interesses do astro de Hollywood.
Com Dredd, a versão cinematográfica do juiz implacável resultou mais sombria, violenta, realista e concentrada no personagem – ainda que ele seja impenetrável para além da sua epiderme. Com visual elaborado e uma atmosfera tensa, o filme é voltado para o público adulto e oferece ótimo entretenimento para os apreciadores do gênero. Antes de seguir em frente, vejamos a sinopse:
O filme conta a história do juiz Joseph Dredd (Karl Urban), que é interrompido na sua rotina de combate ao crime para fazer uma avaliação da aspirante a juiz Cassandra Anderson (Olivia Thirlby). O objetivo é estabelecer se as habilidades psíquicas e extra-sensoriais da moça podem ser úteis em situações de campo. A primeira missão da dupla é atender a uma ocorrência em Peach Trees, um edifício com 200 andares onde vivem 10 mil pessoas – uma verdadeira cidade! Eles descobrem que no local comercializam uma nova droga chamada Slo-Mo, que desacelera a noção de tempo do usuário. Faz com que ele passe a 1% da velocidade normal. Dredd e sua parceira farão de tudo para acabar com os traficantes, mas a poderosa chefona Ma-Ma (Lena Headey) inicia um jogo com níveis de violência impensáveis: ela fecha o edifício e ordena uma caçada implacável aos juízes.
O filme conta a história do juiz Joseph Dredd (Karl Urban), que é interrompido na sua rotina de combate ao crime para fazer uma avaliação da aspirante a juiz Cassandra Anderson (Olivia Thirlby). O objetivo é estabelecer se as habilidades psíquicas e extra-sensoriais da moça podem ser úteis em situações de campo. A primeira missão da dupla é atender a uma ocorrência em Peach Trees, um edifício com 200 andares onde vivem 10 mil pessoas – uma verdadeira cidade! Eles descobrem que no local comercializam uma nova droga chamada Slo-Mo, que desacelera a noção de tempo do usuário. Faz com que ele passe a 1% da velocidade normal. Dredd e sua parceira farão de tudo para acabar com os traficantes, mas a poderosa chefona Ma-Ma (Lena Headey) inicia um jogo com níveis de violência impensáveis: ela fecha o edifício e ordena uma caçada implacável aos juízes.
O roteiro de Dredd foi escrito pelo experiente Alex Garland, que já escreveu e dirigiu filmes como Ex Machina: Instinto Artificial, Aniquilação e o recente Guerra Civil. Com um orçamento mais limitado, ele decidiu que não tentaria retratar a complexidade de Mega City One, mas ficaria concentrado na essência do personagem. Depois de alguns tratamentos, onde tentou adaptar algumas das histórias já publicadas nos quadrinhos, ele preferiu criar uma abordagem episódica, que não exigisse grandes doses de conhecimento prévio por parte do espectador. Retratou a batalha no dia-a-dia do personagem, mas aproveitou a concepção dos gigantescos edifícios para trazer o universo do juiz Dredd para algo mais próximo do que já vivemos hoje, em nossas megacidades com suas favelas gigantescas.
O diretor Pete Travis, que anteriormente dirigiu Ponto de Vista e realizou filmes para a TV inglesa, assumiu as rédeas do projeto e impôs um ritmo ágil e tenso. Concentrou-se no público adulto e soube extrair um clima asfixiante dos espaços confinados onde a ação ficou restrita. Deixou de lado o tratamento gráfico demasiado alegórico dos quadrinhos e adotou um visual mais realista, que só reforçou a aspereza do personagem. Sem jamais tirar seu capacete, nunca vemos o ator que lhe dá vida. Apenas vemos o juiz inflexível, robótico, que não se curva diante do mundo que tenta destruí-lo a todo custo.
Em Mega City One, seus 800 milhões de habitantes apenas se ocupam em tentar sobreviver. Deixaram de se preocupar com questões subjetivas, como é o caso da... justiça! Preferem o pragmatismo e a comodidade do sistema comandado pelos juízes. Ainda bem que ao menos um deles é verdadeiramente rígido, imparcial, isonômico e intocável. Ainda bem que esta adaptação redimiu aquela outra tentativa desastrada, estrelada no século passado por Sylvester Stallone.
Resenha crítica do filme Dredd
Ano de produção: 2012Direção: Pete Travis
Roteiro: Alex Garland
Elenco: Karl Urban, Olivia Thirlby, Lena Headey, Wood Harris, Langley Kirkwood, Junior Singo, Luke Tyler, Jason Cope, Domhnall Gleeson, Warrick Grier e DeObia Oparei
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