Presságio: mistério, catástrofe e muita ação

Cena do filme Presságio
Presságio: direção de Alex Proyas

OS DOIS PRIMEIROS ATOS FUNCIONAM. O ÚLTIMO É UMA BOBAGEM!

Na juventude, fui um cinéfilo mais criterioso. Só entrava numa sala de exibição se o filme valesse o preço do ingresso. Além disso, tinha que escolher entre uma lista reduzida de títulos – Curitiba contava com dezena de cinemas, onde os lançamentos ficavam em cartaz por poucas semanas. Para decidir com sabedoria onde gastar meu suado dinheirinho, a solução era vasculhar os cadernos de cultura dos jornais e as revistas especializadas; lia muito sobre cinema e quando me sentava na plateia, já sabia o que esperar.
        Hoje, a oferta de filmes beira o infinito. Nas plataformas de streaming, o valor da assinatura é o mesmo, caso você assista a um único filme por mês ou a cinco por dia! Tornei-me um cinéfilo mais impulsivo. Aperto o play com facilidade, pois sei que posso mudar de ideia ao primeiro sinal de arrependimento. Foi com esse espírito armado que comecei a assistir ao filme Presságio, dirigido pelo australiano Alex Proyas em 2009 – impliquei com a presença de Nicolas Cage, um ator irregular e dado aos maneirismos. Para minha surpresa, fiquei hipnotizado nos dois primeiros atos e fui até os créditos finais, ainda que o último ato tenha sido decepcionante.
        Presságio é um thriller de mistério, que descamba para o cinema catástrofe e exala notas de ficção científica. Aproveita todas as oportunidades para gerar suspense e se abre para temas religiosos, ainda que jamais se atreva a discuti-los em profundidade. Acompanha personagens atormentados, que mal conseguem lidar com as próprias dores, mas se pegam tentando amparar a humanidade inteira diante da iminência do fim dos tempos. É um filme pretensioso, mas tem estofo comercial para agradar aos fãs do gênero. Tem méritos e deméritos, em doses parecidas; antes de esmiuçá-los, porém, é mais prudente apresentar a sinopse:
        O filme conta a história do professor de astrofísica do MIT, John Koestler (Nicolas Cage), um viúvo ainda enlutado que tenta seguir a vida criando o filho, o pequeno Caleb (Chandler Canterbury). Quando o garoto traz para casa uma folha de papel preenchida com uma longa sequência números, John não dá importância – o papel estava em uma capsula do tempo, lacrada há 50 anos e repleta de desenhos, que as crianças de 1959 fizeram especialmente para as crianças de 2009. Por acaso, o astrofísico reconhece um padrão numérico na tabela e depois de pesquisar na internet, chega a uma conclusão estarrecedora: os números aludem com precisão a eventos catastróficos que ocorreram ao longo dos últimos 50 anos! John passa por experiências perturbadoras, até se convencer de que as previsões são verdadeiras. Para resolver o mistério, desvendar seus significados e evitar que as últimas catástrofes se concretizem, ele contará com a ajuda de Diana (Rose Byrne) e sua filha, Abby (Lara Robinson), descendentes da menina que previu um futuro aterrador.
        Essa história envolvente foi criada em 2001 por Ryne Douglas Pearson, autor de vários romances (entre eles Simple Simon, adaptado para o cinema em 1998 com o título de Código Para o Inferno e estrelado por Bruce Willis). Presságio, entretanto, já nasceu como roteiro para o cinema. Foi pensado para ser um filme bem mais intimista, onde o personagem de Nicolas Cage mantém o foco nas questões existenciais e tenta lidar com a morte da esposa; contudo, descobre que ela poderia ter sido salva, caso ele já soubesse das previsões reveladas pela tal capsula do tempo. Há um destino já sacramentado? Existe, afinal, o livre-arbítrio? Deus está no comando? Todas essas perguntas pipocavam, para suscitar reflexões mais profundas.
        Em 2005, quando o diretor Alex Proyas ingressou no projeto, trouxe consigo uma nova abordagem. O protagonista passou a lidar com temas mais urgentes, para além do seu próprio mundinho; embarcou numa verdadeira epopeia, onde o que está em risco é a própria salvação da humanidade. Para transformar Presságio num espetáculo visual similar a Eu, Robô – seu trabalho anterior – o diretor combinou elementos de mistério e catástrofe, para imprimir um senso de urgência e alimentar as cenas de ação. Convocou o casal de roteiristas Juliet Snowden e Stiles White, especializados em filmes de terror – a dupla já escreveu Ouija: O Jogo dos Espíritos e Possessão – para escrever um novo tratamento, mantendo a premissa básica do roteiro original.
        As cenas iniciais, com a construção do mistério, são envolventes e perturbadoras. As cenas de desastre são de tirar o fôlego. A busca dos personagens por respostas convincentes é legítima e move a trama com agilidade. O problema surge justamente quando os realizadores decidem entregar as respostas de bandeja, embaladas para presente, no último ato. O castelo desaba em uma pirotecnia gnóstica, salpicada de ambiguidades, engendrada para que cada espectador tire suas próprias conclusões. Ateus, cristãos, místicos, esotéricos e até os que consideram a impossibilidade de provar a existência de Deus, sentem-se confortáveis diante de um final feliz.
        Com o fim do mistério, vem o desencantamento. O diretor perdeu uma excelente oportunidade para falar sobre Deus, sobre as profecias bíblicas, sobre o sentido da vida, sobre os caminhos da salvação... Preferiu um final previsível, sinalizado com insistência em diversos momentos do filme. Quanto a mim, gostaria que o final ficasse em aberto; que me fizesse introspectivo, a remoer as questões verdadeiramente importantes. Pelo menos não me irritei com os maneirismos de Nicolas Cage; o ator até que entregou uma atuação equilibrada e mais contida do que é seu costume. O que não me impede de cogitar: se fosse em seu lugar um ator com melhores recursos?

Resenha crítica do filme Presságio

Título original: Knowing
Ano de produção: 2009
Direção: Alex Proyas
Roteiro: Ryne Douglas Pearson, Juliet Snowden e Stiles White
Elenco: Nicolas Cage, Rose Byrne, Chandler Canterbury, Joshua Long, Ben Mendelsohn, Lara Robinson, D.G. Maloney, Nadia Townsend, Alan Hopgood, Adrienne Pickering, Alethea McGrath, Danielle Carter, Tamara Donnellan, Travis Waite, Liam Hemsworth, Gareth Yuen, Ra Chapman, Terry Camilleri,Benita Collings e Blair Venn

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