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Mostrando postagens de maio, 2022

Posto de Combate: crônica de uma batalha real

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HOMENS COMUNS, VIVEM UMA SITUAÇÃO EXTRAORDINÁRIA Este não é um filme de ação. É um drama de guerra, filmado como uma homenagem a soldados reais, que lutaram de verdade. Alguns morreram, outros saíram feridos e trouxeram sequelas de uma das mais difíceis batalhas no Afeganistão. Posto de Combate , dirigido por Rod Lurie em 2020, é o tipo de filme que causa arrepios nos ideólogos de plantão – aqueles que batem o pé no antiamericanismo, ainda que os inimigos da vez sejam os execráveis talibãs! Já os desavisados, que como eu tropeçam na capa desse filme no serviço de streaming e resolvem conferir, podem se decepcionar com a falta de cenas retumbantes e recheadas de efeitos especiais. Não encontrarão personagens retratados em profundidade, nem subtramas envolventes. Tudo o que acompanharão é uma espécie de crônica, que se apega à cronologia dos fatos para entregar um relato preciso do campo de batalha.           Em Posto de Combate , porém, encontrei muito mais ...

Solaris: filme de 1972 dirigido por Andrei Tarkovski

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Solaris: filme de Andrei Tarkoviski FICÇÃO CIENTÍFICA COM A MÁXIMA DENSIDADE EMOCIONAL O cineasta russo Andrei Tarkovski se dizia um escultor. A matéria-prima com a qual esculpia seus filmes era o tempo. E ele fazia isso com gosto. Seus planos longos se estendem muito mais do que as plateias ocidentais estão acostumadas. Seu cinema é para fazer pensar, ou melhor, para estimular o espectador a meditar. Exige que a audiência traga para a sala de cinema uma bagagem considerável: arte, filosofia, psicologia, história... Demanda conexões que não são todos os cinéfilos que estão dispostos a fazer. Seu filme mais ocidentalizado – e talvez por isso, aquele que dizia menos gostar – é Solaris , uma obra de ficção científica que ele realizou em 1972. O filme é conhecido por rivalizar com o Clássico de Stanley Kubrick 2001 - Uma Odisseia no Espaço , de 1968. Mas essa história de rivalidade é uma bobagem. As duas obras se tocam em apenas dois pontos: o apuro visual envolvido na sua concepção e o fa...

Terra Selvagem: uma ficção inspirada em fatos

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Terra Selvagem: direção de Taylor Sheridan ELEMENTOS DE WESTERN, NUM ROTEIRO IMPECÁVEL O diretor Taylor Sheridan realizou uma façanha e tanto. Em questão de três anos teve seu nome envolvido em três ótimos filmes, que alcançaram grande sucesso nas bilheterias e na opinião dos críticos. Primeiro, como roteirista, ele emplacou em 2015 o filme Sicario: Terra de Ninguém , dirigido por Denis Villeneuve. Repetiu a dose em 2016, com A Qualquer Custo , dirigido por David Mackenzie – inclusive indicado ao Oscar de melhor roteiro original. E em 2017 o próprio Sheridan decidiu filmar um de seus roteiros e realizou o ótimo Terra Selvagem .           Apesar de contar histórias bem distintas, as três produções guardam um elemento em comum: a temática violenta, que se passa em terras remotas e fora do alcance da lei e da ordem. Os cinéfilos logo identificarão, nessa espécie de trilogia, os elementos herdados do gênero western, mas perceberão que eles aparecem renovados, u...

Toscana: romantismo, gastronomia e uma fotografia deslumbrante

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Toscana: dirigido por Mahdi Avaz QUEM DISSE QUE O CINEMA NÃO COMUNICA SABORES E AROMAS? A imprensa já anunciava com insistência: uma frente fria chegava do sul para derrubar as temperaturas em Curitiba. Na noite em que ela finalmente deu as caras, encontrou Ludy e eu enrolados num cobertor, acomodados no sofá em frente à TV. Zapeávamos pelo serviço de streaming, na tentativa de chegar a um acordo: um filme de ação com tiros e perseguições ou um drama denso, que mergulhasse em temas mais profundos. Então, nos deparamos com o título Toscana , dirigido em 2022 pelo dinamarquês de origem iraniana Mehdi Avaz. Minha mulher abriu um sorriso e me lançou um olhar de interrogação – estaria eu disposto a assistir a mais um filme romântico ambientado na Toscana, protagonizado por um chefe de cozinha, que provavelmente mostraria belíssimas paisagens e que abusaria das referências gastronômicas? E por que não! Apertei o play e tratamos de ser felizes!           Ludy e eu...

Duna: história repleta de significados, com tempero artístico

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Duna: filme de Denis Villeneuve EXCELÊNCIA VISUAL, NUMA ABORDAGEM REALISTA Lembro que assisti ao filme Duna , dirigido em 1984 por David Lynch, em uma sala de cinema. Entrei empolgado, pois além de apreciar o gênero ficção científica, estava prestes a degustar uma produção escrita e dirigida pelo diretor cujo filme anterior havia sido O Homem Elefante . Saí frustrado. Excessivamente alegórico e preso a minúcias teatrais, o filme me pareceu... chato! Mas seu tom épico gerou um certo burburinho na mídia, o que me levou a ler o livro Duna, escrito por Frank Herbert em 1965. Confesso que meu nível de empolgação continuou baixo. Embora tenha percebido a importância da obra para o gênero – o autor foi um precursor da saga de ficção científica, como a conhecemos hoje – não me tornei um fã. Talvez estivesse anestesiado pelo impacto de Blade Runner – O Caçador de Androides , esse sim um filme que marcou a década de 1980.           O propósito dessa introduçã...

O Grande Lebowski: o filme mais engraçado dos irmãos Coen

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O Grande Lebowski: direção de Joel Coen QUAL A MELHOR RECEITA PARA FAZER COMÉDIA? O homem conta histórias desde os primórdios, algumas tristes, outras engraçadas. Para começar a encená-las, foi preciso apenas um estalo de dedos. No princípio as encenações tinham função religiosa, mas as motivações festivas se impuseram. Surgiram a tragédia e a comédia, que apesar de distintas, sempre foram faces da mesma moeda – a da dramatização. No entanto, na história das artes narrativas, logo ficou evidente que fazer rir demandava mais esforço. Ironia, sarcasmo, carisma, espontaneidade... Para o comediante, não bastava talento dramático, era preciso muito mais. Passados milênios, eles são os primeiros a admitir: não há fórmula garantida para provocar o riso. Pode-se pegar ingredientes testados e consagrados, misturá-los na sequência certa, deixá-los descansar, sovar, levá-los ao forno e caprichar na apresentação... Nada disso garante que o riso será ouvido na plateia. Os irmãos Ethan e Joel Coen s...

Última Chance: um filme policial raso e dispensável

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Última Chance: direção de Steven C. Miller QUAL É MESMO O TÍTULO DESTE FILME? Segunda-feira à noite, esparramado no sofá, com o controle remoto na mão, navegava pelos serviços de streaming à cata de entretenimento. O risco de fazer a escolha errada e terminar decepcionado é imenso. Ainda assim, sou viciado nesse jogo! Mesmo ao apostar em um filme que se releva ruim, tento tirar algum proveito, alguma lição. Última Chance , dirigido em 2019 por Steven C. Miller, tem poucos ensinamentos para oferecer no campo cinematográfico, mas faz refletir sobre o imbróglio no qual estamos nos metendo enquanto sociedade hiperconectada. Mas antes de entrar nesse mérito, vamos pôr à mesa uma sinopse, para deixar claro que se trata de uma produção repleta de cartas marcadas.           Frank Penny (Aaron Eckhart) é outro daqueles policiais duros de matar, sem um passado que lhe dê base psicológica, caráter ou moral. Tudo o que temos para caracterizá-lo é o uniforme azul e a es...

Um Lugar Chamado Notting Hill: um bairro de Londres rouba a cena romântica

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Um Lugar Chamado Notting Hill: direção de Roger Michell É FANTASIA, MAS QUANTA AUTENTICIDADE! – Ora, me poupe! – exclama o sujeito, depois de colocar o pronome na frente de tudo só para mostrar seu descontentamento. Com tantas opções no streaming, a mulher tinha que escolher justo uma comédia romântica? Ainda por cima das antigas!           – Esse filme é tão leve... Não canso de assistir. – Ela nem desgruda o olho da tela para responder.           O sujeito faz o que precisa ser feito: pega o celular e vai para o seu canto, procurar notícias sobre esporte. Deixa a tela grande à inteira disposição da mulher, que permanece hipnotizada. Um Lugar Chamado Notting Hill , filme de 1999 dirigido por Roger Michell, tem esse efeito anestésico. É cinema assumidamente despretensioso e alienante, que desfralda com orgulho a bandeira do entretenimento e mira sem pudor na bilheteria – uma coleção de heresias imperdoáveis na visão dos purista...

Tempo: um mistério enrolado em questões éticas

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Tempo: filme de M. Night Shyamalan ENVELHECER SEM O BÔNUS DA EXPERIÊNCIA DE VIDA O que é o tempo? A tirada espirituosa de Santo Agostinho, no seu livro autobiográfico As confissões , já virou resposta clássica: “Se ninguém me pergunta, eu o sei, mas se me perguntam, e quero explicar, não sei mais nada.” A frase se popularizou, porque a maioria de nós não quer se perder com divagações. Sempre de olho no relógio, estamos mais preocupados com os compromissos a cumprir. Feito peixes que se movem sem atinar para a existência da água, seguimos com a vida, distraídos para a passagem do tempo. Segundo os físicos, ele é de uma constância implacável: não se apressa, não se cansa, não pára. Mas não é o que diz o senso comum. Quando nos divertimos, o tempo voa, na cadeira do dentista, ele se arrasta. Na medida em que o tempo flui, ficamos mais velhos. E se ficamos mais velhos, é porque acumulamos mais tempo de vida. Essa lógica cristalina vai por terra no filme Tempo , dirigido em 2021 por M. Nigh...

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