Missão Impossível: ação, emoção e diversão

Cena do filme Missão Impossível
Missão Impossível: direção de Brian de Palma

UMA FÓRMULA IRRETOCÁVEL

Quando era garoto, Missão Impossível morava na televisão – aquela caixa volumosa que dominava, feito um altar, a nossa sala de estar. Meu pai exigia silencio assim que ouvia os primeiros acordes do vibrante tema musical e imediatamente acendia o seu cachimbo. Parecia aproveitar o mesmo palito de fósforo que incendiava o estopim na vinheta de abertura, para deixar um rastro de ação, emoção e suspense, enquanto a sala era tomada pela fumaça e pelo perfume seco do tabaco Half and Half – sua marca preferida. Os próximos minutos transcorriam ligeiros e divertidos, enquanto xeretávamos o mundo da espionagem que animava os bastidores da guerra fria.
        Como o próprio título da série já insinuava, a impossibilidade era o elemento que desfazia todos os vínculos com a realidade; as façanhas improváveis dos personagens ensinavam ao espectador a diferença entre verdade e verossimilhança; as dissimulações e os sucessivos pontos de virada deixavam claro que todo o esforço era em nome do entretenimento. Este cinéfilo ingênuo bem que tentava se render ao encantamento, mas meu pai não deixava:
        – Essa não!! Agora eles exageraram! Palhaçada!!!!!
        Missão Impossível era isso mesmo, um compilado de cenas editadas com agilidade para manter o sentido de urgência, acompanhando personagens que corriam contra o relógio. Os mocinhos infalíveis invariavelmente derrotavam os bandidos, mas só depois de passar por todos os perrengues imagináveis. As traquitanas tecnológicas pareciam cruzar os limites da ficção científica e as habilidades dos agentes secretos superavam o desempenho dos atletas de alta performance. Nada disso atrapalhava a diversão – ao contrário! O importante era que, em cada episódio, houvesse uma mensagem autodestruída em cinco segundos e alguém que levasse a mão ao rosto para retirar uma máscara incrivelmente realista e revelar sua verdadeira identidade.
        A série Missão Impossível foi uma criação bem-sucedida do diretor e produtor de TV Bruce Geller; estendeu-se por sete temporadas, levadas ao ar entre 1966 e 1973. Ressuscitou em 1988 e ganhou mais duas temporadas, até que seu apelo televisivo se exauriu. Hollywood, contudo, jamais teve a intenção de interromper a exploração desse veio de ouro reluzente; quem aproveitou a oportunidade foi o produtor Tom Cruise, que adquiriu os direitos para o cinema e inaugurou uma franquia milionária. O astro reuniu uma equipe imbatível, formada por Brian De Palma, Steven Zaillian, David Koepp e Robert Towne; o primeiro nome é conhecido por qualquer cinéfilo que se preze: dirigiu sucessos como Scarface e Os Intocáveis. Os demais, são de roteiristas do primeiríssimo time, responsáveis por verdadeiras obras-primas.
        Portanto, caro leitor, o primeiro filme da franquia Missão Impossível, realizado em 1996, surgiu como um feito narrativo; trouxe para a tela grande a mesma atmosfera que respirávamos na telinha da TV daqueles anos 1960. Comparado aos longas mais recentes, onde Tom Cruise se exibe dispensando dublês em ousadias cada vez mais espetaculares, é mais lento e cadenciado; ainda que repleto de ação e emoção, tem o ímpeto menos afoito, próprio dos clássicos filmes de espionagem. Vale a pena recapitular a sinopse:
        O que acompanhamos é a história de Ethan Hunt (Tom Cruise), um jovem agente secreto que faz parte da equipe da IMF (Impossible Mission Force), chefiada por Jim Phelps (Jon Voight). Durante uma missão em Praga, quando tentavam evitar o roubo de uma lista com as identidades de todos os agentes secretos da CIA na Europa, seus colegas são assassinados. Ethan é incriminado e passa a ser perseguido pela CIA. Para provar sua inocência ele terá que negociar com os criminosos e despistar os agentes do governo. Contará com a ajuda da viúva de Jim, Claire (Emmanuelle Béart), do hacker Luther Stickell (Ving Rhames) e do piloto Franz Krieger (Jean Reno); e terá que realizar proezas espetaculares, correndo contra o relógio, usando máscaras incrivelmente realistas e esbarrando em todos os limites da verossimilhança.
        Espertamente, os pontos fortes da série original foram mantidos; o principal deles, é claro, está no memorável tema de abertura, intitulado Theme from Mission: Impossible, de autoria do compositor argentino Lalo Schifrin. A música, orquestrada com brilhantismo, consegue condensar todos os sentimentos que percorrem nossas artérias durante as cenas de ação – é uma espécie de bomba de adrenalina pulsante, pontilhando em Código Morse um pedido por mais e mais emoção desenfreada. O tema foi regravado pela dupla Adam Clayton e Larry Mullen Jr., integrantes da banda U2, que o modernizaram para agradar ao público da virada de século; foram respeitosos e reverentes, mas trouxeram um toque mais... dançante. Particularmente, prefiro a orquestração clássica de Lalo Schifrin, pontuada pela batida sofisticada dos bongôs; era tão hipnótica que meu pai nem precisava exigir silêncio. Bastava ouvir as primeiras notas para me por sentado, com os olhos vidrados na tela, enquanto o estopim aceso deixava o rastro de ação, emoção e suspense por toda a sala, tomada pela fumaça e pelo perfume seco do tabaco Half and Half, a marca preferida do meu pai. Viva o cinema!!!

Resenha crítica do filme Missão Impossível

Título original: Mission: Impossible
Ano de produção: 1996
Direção: Brian De Palma
Roteiro: David Koepp e Robert Towne
Elenco: Tom Cruise, Jon Voight, Emmanuelle Béart, Henry Czerny, Jean Reno, Ving Rhames, Vanessa Redgrave, Kristin Scott Thomas, Ingeborga Dapkūnaitė, Emilio Estevez, Rolf Saxon e Marcel Iureș

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