Eden: um thriller de mistério ágil e perturbador

Eden: direção de Ron Howard
PARA SOBREVIVER, É PRECISO LUTAR CONTRA A NATUREZA HUMANA
O diretor Ron Howard tem uma carreira marcada por filmes memoráveis, como Rush - No Limite da Emoção, A Luta Pela Esperança, O Preço de um Resgate, Uma Mente Brilhante e Era uma Vez um Sonho. Quando vi seu nome na direção de Eden, filme realizado em 2024, já fiquei motivado a apertar o play; a empolgação aumentou quando reparei no elenco estrelado que ele conseguiu reunir: Jude Law, Vanessa Kirby, Daniel Brühl, Sydney Sweeney e Ana de Armas! Apostei todas as fichas que encontraria bom entretenimento e não me arrependi.Devo alertar que Eden é um filme incomum na cinematografia de Ron Howard. É um thriller de suspense perturbador e sinistro, diferente do que assistimos em seus filmes de apelos comercial; é baseado em uma história real, mas mergulha nos demônios internos de oito personagens multifacetados, que estão em luta, tentando sobreviver numa ilha isolada do resto da humanidade. A estratégia de marketing usada para promover o filme tenta fazer algum mistério sobre quais deles sobreviverão, porém o enredo tem muito mais a oferecer do que algum suspense barato. Vamos direto para a sinopse, para depois desenvolver o tema em detalhes.
Eden conta a história de como o casal de alemães Heinz (Daniel Brühl) e Margret Wittmer (Sydney Sweeney), acompanhados do filho doente, Harry (Jonathan Tittel), chegam à ilha Floreana, no arquipélago de Galápagos, no Equador. O ano é 1921 e eles fogem do inferno que a Alemanha se tornou após a Primeira Guerra Mundial. Escolheram aquela ilha desabitada em particular porque se encantaram com os artigos publicados com sensacionalismo na imprensa do seu país, escritos pelo Dr. Friedrich Ritter (Jude Law), um médico com pretensões literárias. Isolado com sua mulher, Dore Strauch (Vanessa Kirby), acometida de esclerose múltipla, o médico não acolhe seus novos vizinhos; está mais preocupado em datilografar suas elucubrações filosóficas acerca do futuro da humanidade, seguindo as mesmas pegadas de Nietzche. Os recém-chegados, porém, são colonos determinados e tratam de ocupar seu canto da ilha.
Eis que desembarca na praia a autoproclamada baronesa Eloise Bosquet de Wagner Wehrhorn (Ana de Armas), acompanhada por dois jovens amantes, Robert (Toby Wallace) e Rudolph (Felix Kammerer). Esfuziante e invasiva, ela também chega atraída pelos artigos publicados pelo Dr. Ritter, mas traz consigo o propósito de construir na ilha um hotel de luxo e assim se tornar anfitriã da elite global. O trio monta um acampamento hedonista improvisado ao lado da casa construída a duras penas pelos Wittmer e passam a sugar, feito parasitas, os parcos recursos naturais do local. Em pouco tempo, os três grupos estarão se digladiando para sobreviver e para impor visões de mundo antagônicas.
Os personagens que acompanhamos em Eden são antipáticos e desagradáveis. É difícil estabelecer com eles alguma empatia, ainda que exibam o impulso de chutar tudo para o espaço e recomeçar a vida do zero – uma fantasia que, em algum momento, passa pela mente de qualquer um! São testados sob pressão e levados a fazer escolhas decisivas e chocantes. São multifacetados e complexos; revelam-se em todas as suas camadas emocionais, na medida em que lutam contra a natureza e uns contra os outros. Apresentam-se a partir de estereótipos, mas se desenvolvem para além dos clichês, percorrendo arcos dramáticos consistentes.
O diretor Ron Howard tomou conhecimento dessa história real de sobrevivência em uma visita que fez às Ilhas Galápagos e levou 15 anos para transformá-la em filme. Contou com a ajuda do roteirista e produtor canadense Noah Pink (ele criou a série de televisão Genius para o National Geographic e escreveu o roteiro de Tetris), que chegou a desenvolver três tratamentos antes de chegar ao roteiro filmado. Apesar de real, a história contada em Eden é pontuada de contradições. Está baseada em dois relatos completamente diferentes, publicados em livros por dois dos personagens sobreviventes; além disso, há os depoimentos e versões dos habitantes locais, além dos registros históricos apresentados aos turistas que visitam o museu da ilha Floreana.
O diretor e o roteirista perceberam que a história deveria ser contada a partir dos olhos de Margret Wittmer; orbitaram a narrativa ao redor dela, enquanto usaram de liberdades poéticas para sugerir os arcos dos demais personagens. Aproveitaram também para dramatizar o envolvimento de um nono personagem real, o multimilionário G. Allen Hancock; famoso por ter influenciado a história de Los Angeles e Hollywood, ele realizou várias expedições pela ilha Floreana e levou consigo uma equipe de filmagem que registrou momentos importantes dessa história. Ele chegou inclusive a realizar um filme mudo estrelado pela tal Baronesa interpretada por Ana de Armas.
Eden é um filme provocador e, em muitos momentos, incômodo. Expõe a natureza humana em seus detalhes mais desagradáveis, principalmente quando a hipocrisia e as dissimulações vêm para embaralhar os relacionamentos e intensificar os conflitos. O elenco impecável entrega atuações intensas e garante verossimilhança. A direção precisa de Ron Howard garante agilidade e tensão crescente. A música envolvente de Hans Zimmer e a fotografia deslumbrante de Mathias Herndl garantem excelência audiovisual. Ao final, ficamos com um thriller de época perturbador, mas sintonizado com muitas das preocupações contemporâneas acerca das nossas individualidades e de como elas afetam a vida em sociedade. Vale a pena conferir!
Resenha crítica do filme Eden
Ano de prosução: 2024Direção: Ron Howard
Roteiro: Noah Pink
Elenco: Jude Law, Vanessa Kirby, Daniel Brühl, Sydney Sweeney, Ana de Armas, Jonathan Tittel, Richard Roxburgh, Toby Wallace, Felix Kammerer e Ignacio Gasparini
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