Relatos do Mundo: filme estrelado por Tom Hanks

Cena do filme Relatos do Mundo
Relatos do Mundo: filme dirigido por Paul Greengrass

UM CONTADOR DE HISTÓRIAS E UMA ÓRFÃ JUDIADA ENCONTRAM O CAMINHO DA ESPERANÇA

Lançado pela Netflix, o filme Relatos do Mundo, dirigido em 2020 por Paul Greengrass, traz na capa um apelo irresistível: a imagem de Tom Hanks. Ao dar de cara com a foto do ator, de barbas grisalhas, Ludy não pensou duas vezes:
        – Olha só! Esse deve ser legal! Tá a fim de conferir?
        – Só se for agora – concordei de pronto. Sem esconder a empolgação, liguei a matraca e comecei a desfiar um monte de explicações – Ah, esse é o novo western do mesmo diretor de Capitão Phillips e 22 de Julho! Ele gosta de filmar com a câmera nervosa e manda muito bem nos thrillers de ação. Lembra daquele segundo filme da trilogia Jason Bourne? Pois é, vários diretores passaram a copiar o estilo dele...
        – Tá legal... mas podemos ver o filme? Depois você fala disso tudo lá na Crônica de Cinema.
        Minha mulher estava certa! Filmes precisam ser avaliados pelo que são, não por atributos externos ou comparações. Além disso, o prazer de assistir a um bom filme deve ser tão grande quanto o de falar sobre ele, depois, com os amigos. Fechei a matraca e me concentrei em Relatos do Mundo.
        Logo de início notei a ausência da tal câmera nervosa. Ao invés disso, as imagens estáveis e lindamente fotografadas me remeteram aos filmes de John Ford, anunciando que esta produção segue os cânones dos westerns clássicos. A diferença é que traz Tom Hanks estreando no gênero.
        Aqui ele encarna o Capitão Jefferson Kyle Kidd, um ex-combatente da guerra civil americana, que traz cicatrizes no corpo e na alma; também carrega na mochila algumas edições de diferentes jornais e percorre as minúsculas cidades empoeiradas do Texas para ler as notícias em reuniões com moradores – muitos certamente analfabetos e todos ávidos por acompanhar os rumos do país ainda em ebulição. Quando encontra Johanna, uma menina de 11 anos abandonada na estrada depois que a família de índios Kiowa que a adotou foi massacrada – aos seis anos ela já havia presenciado o massacre da sua família verdadeira de imigrantes alemães – o capitão Kidd decide levá-la consigo e entregá-la às autoridades.
        O encontro de um homem bom e íntegro com uma menina duplamente órfã será difícil, permeado de imprevistos e acontecimentos trágicos. Nem sequer falam o mesmo idioma! Aos poucos, no entanto, constroem um entendimento para além dos seus mundos internos e caminham para estabelecer fortes laços, como os de um pai com sua filha. É assim que Relatos do Mundo termina por se mostrar um western diferente: sensível e salpicado de poesia.
        Para filmar essa história baseada no romance da escritora americana Paulette Jiles, o diretor inglês Paul Greengrass escreveu o roteiro em parceria com Luke Davies – que também assinou Lion: Uma Jornada para Casa; juntos conseguiram construir uma narrativa simples e repleta de passagens emocionantes. Tiveram também o bom senso de não se prender às óbvias questões políticas, sociais e étnicas que dividem a América; ao invés disso, focalizaram o drama humano, que acontece no âmbito de indivíduos livres, capazes de estabelecer seus próprios entendimentos e tomar suas decisões sem a tutela dos governos.
        O tema que dá coesão a Relatos do Mundo é a comunicação, não só aquela que abraça o capitão Kidd e a menina Johanna – e permite que ambos compartilhem suas visões de mundo –, mas principalmente aquela que se estabelece entre um contador de histórias e seu público. Numa época em que não havia veículos de comunicação de massa, e em lugares inalcançáveis pelos eventos culturais, o capitão Kidd nos lembra a figura de um formador de opinião; uma espécie de blogueiro, que parte das notícias mais banais e consegue envolver sua audiência com boas histórias, que emocionam, aproximam indivíduos, geram identidade e servem de alívio para as pressões do mundo.
        Mesmo em 1870, como acontece hoje em dia, um contador de histórias que lida com notícias precisa ter... credibilidade! E isso não falta ao capitão Kidd. Por onde passa, encontra amigos que o reconhecem como um homem digno e independente – exerce seu ofício sem ceder às pressões daqueles que querem colocar palavras na sua boca. É fácil enxergar no personagem o protótipo dos bons profissionais da imprensa.
        Para concluir essa crônica sobre Relatos do Mundo, quero novamente pronunciar o nome de Tom Hanks. Para atuar no seu primeiro western, ele trouxe consigo a reconhecida capacidade de compreender um personagem em todas as suas camadas e expressá-las não só nas palavras, mas também nos silêncios. Mas o nome da pequena Helena Zengel também merece destaque; ao lado do astro, ela também brilhou; mostrou que tem recursos de sobra ascender em futuros papéis.
        Para narrar essa jornada solitária, sobre um homem em guerra com seu passado e uma menina em busca de um futuro, o diretor Paul Greengrass traçou um caminho de esperança e redenção; conseguiu romper os grilhões que o prendiam aos filmes de ação. Vale a pena conferir!

Resenha crítica do filme Relatos do Mundo

Ano produção: 2020
Diretor: Paul Greengrass
Roteiro: Paul Greengrass e Luke Davies
Elenco: Tom Hanks, Helena Zengel, Elizabeth Marvel, Tom Astor, Andy Kastelic, Travis Johnson e Mare Winningham

Comentários

  1. Lelia Moreira da Frota20/02/2024, 09:12

    Vc é este dom maravilhoso de escrever sempre despertando desejos em mim de correr atrás para assistir !

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    Respostas
    1. Ah, muito obrigado, Leila. Esse filme é mesmo uma ótima recomendação.

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