Glória Feita de Sangue: um ótimo drama de guerra

Cena do filme Glória Feita de Sangue
Glória Feita de Sangue: filme dirigido por Stanley Kubrick

QUANDO OS CANALHAS SE REFUGIAM NAS FILEIRAS DO PATRIOTISMO

        Na primeira vez em que assisti ao filme Glória Feita de Sangue, realizado em 1957 por Stanley Kubrick, devia ter uns 20 anos. Era de madrugada, estava com insônia e liguei a TV. Por coincidência o filme começou a ser exibido naquele instante. Me acomodei no sofá e pensei:
        – É um filme velho, de 1957 e ainda por cima em preto-e-branco... Em pouco tempo vou estar dormindo.
        Como me enganei! Não só acompanhei com entusiasmo como decidi que aquele seria, dalí em diante, um dos dez filmes que levaria comigo se tivesse que passar um tempo em uma ilha deserta. Uma obra incrível, que Kubrick dirigiu antes de completar seus 30 anos!
        Glória Feita de Sangue baseou-se no romance escrito em 1935 por Humphrey Cobb, inspirado num artigo que leu no New York Times, sobre cinco soldados franceses na Primeira Guerra Mundial, que foram executados por um pelotão de fuzilamento. Stanley Kubrick abraçou a ideia de transformá-lo em filme e trabalhou em colaboração com o roteirista Jim Thompson e com Calder Willinghan para tentar convencer algum estúdio. Mas foi só quando Kirk Douglas, astro consagrado de Hollywood se envolveu de corpo e alma, que o projeto foi viabilizado.
        O filme nos conta a história do coronel Dax, vivido por Kirk Douglas. Na frente de batalha da Primeira Guerra Mundial ele comanda soldados franceses na guerra de trincheira contra os alemães. Quando o general Paul Mireau ordena um ataque suicida, se depara com um motim: seus guerreiros se recusam a atacar. O que faz o general? Manda que a artilharia atire contra seus próprios homens. Diante da nova recusa, o alto comando instaura uma corte marcial. Três soldados são escolhidos para servir como bode expiatório. Serão julgados e fuzilados, mas o coronel Dax será o advogado de defesa que tentará salvá-los.
        Filmes de guerra normalmente são feitos para glorificar a batalha, seus atos de bravura e o patriotismo. Glória Feita de Sangue não segue esse caminho fácil. Kubrick o realizou como um melodrama, proclamando uma clara mensagem contra a guerra. Em certo momento, o personagem de Kirk Douglas – heroico e honrado como caberia a um astro do cinema – chega a dizer que “o patriotismo é o último refúgio do canalha”. Observe que, por meio de tal citação ele não diz que patriotismo é coisa de canalha, ou que todo patriota é canalha. Apenas lembra que quando se esgotarem todas as desculpas por suas canalhices, o canalha certamente vai se defender, dizendo que as cometeu por puro patriotismo. Quem acreditar, estará agindo como canalha! Em tempo, é preciso lembrar que, como bem apontou o leitor Jorge Marum em um comentário, a frase acima é atribuída ao escritor do século XVIII, Samuel Johnson, um dos principais nomes da literatura britânica, autor de várias biografias e um crítico literário destacado – sua obra mais popular é o Dicionário da Língua Inglesa, que publicou em 1755.
        O que salta aos olhos, num primeiro momento, são a excelência técnica e a qualidade de produção, que se agigantam na tela. As cenas de batalha são de uma intensidade dramática assustadora. Mas esses atributos só fazem um grande filme quando se subordinam à ousadia de um diretor competente. Glória Feita de Sangue, um autêntico Kubrick que me mostrou uma nova maneira de encarar os dramas de guerra.

Resenha crítica do filme Glória Feita de Sangue

Data de produção: 1957
Direção: Stanley Kubrick
Roteiro: Humphrey Cobb, Stanley Kubrick e Calder Willingham
Elenco: Kirk Douglas, 
Ralph Meeker, Adolphe Menjou, George Macready, Wayne Morris, Richard Anderson, Timothy Carey, Bert Freed e Joseph Turkel

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