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Mostrando postagens com o rótulo Drama

A Árvore da Vida: a densidade de um poema cinematográfico

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A Árvore da Vida: direção de Terrence Malick BUSCANDO UM SENTIDO ESPIRITUAL Com qual finalidade alguém clica no play e começa a assistir a um filme no serviço de streaming? Tal pergunta, feita assim, de supetão, gera uma diversidade de respostas: para passar o tempo, para se divertir, para se aprofundar em algum assunto, para aprender algo, para se emocionar... No final das contas, todas as respostas convergem para um único ponto: o objetivo é sempre fruir uma boa história. Quem se põe a assistir ao filme A Árvore da Vida , dirigido em 2011 por Terrence Malick, certamente espera acompanhar uma boa narrativa – nada mais natural para quem se depara com as fotos de Brad Pitt, Sean Penn e Jessica Chastain na capa e lê a sinopse sobre as desventuras de uma família texana na década de 1950. O problema, para os desavisados, é que o diretor é notório por seu estilo não narrativo e a história que se propõe a contar está tão entranhada nos corredores secretos da sua própria alma, que vem codific

Os Fabelmans: filmando verdades emocionais

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Os Fabelmans: direção de Steven Spielberg A VERDADE ESTÁ NO... CINEMA! O impulso de realizar um filme autobiográfico sempre apareceu para cutucar o diretor Steven Spielberg – tentação para qualquer contador de histórias contumaz. Os Fabelmans , que ele dirigiu em 2022, é finalmente essa tão aguardada obra. E nos chega com tamanha graça, vivacidade e profundidade emocional, que ouso colocá-lo entre seus filmes mais envolventes e arrebatadores.           Os cinéfilos – e a crítica cinematográfica – sempre enxergaram nos filmes de Spielberg diversos elementos reveladores de sua personalidade e de sua herança familiar. Sempre aparecem expostos nas entrelinhas dos seus roteiros e se tornaram conhecidos do público, na medida em que ele virou celebridade e se firmou como um dos maiores diretores da história do cinema. Agora, chegou o momento de Spielberg se revelar por inteiro, ousando um nível de exposição inédito.           Os Fabelmans é, sim, uma ousadia. Certamente provocou momentos int

A Luta Pela Esperança: uma história incrivelmente real

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A Luta Pela Esperança: direção de Ron Howard ESTÁ MAIS PARA PAI DE FAMÍLIA DO QUE PARA PUGILISTA Minha última crônica foi sobre o lutador de boxe asqueroso e desagradável retratado por Martin Scorsese no seu excelente Touro Indomável . Para ficar no tema, decidi escrever agora sobre o seu exato oposto, o lutador de boxe bom caráter e aferrado a sólidos valores éticos, que foi nocauteado pela grande depressão econômica na década de 1930, despencou para a miséria, mas conseguiu se reerguer e conquistar o título de campeão mundial dos meio-pesados. Sua história está contada no filme A Luta Pela Esperança , dirigido em 2005 por Ron Howard.           O protagonista dessa história verdadeira e tocante é James J. Braddock, um boxeador compenetrado no ringue e pai de família dedicado fora dele. Sua trajetória de superação, que lembra um conto de fadas, rendeu-lhe o apelido de Cinderella Man, dado por um jornalista esportivo chamado Damon Runyan – o que explica o título original do filme. A dim

Touro Indomável: um clássico memorável

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Touro Indomável: direção de Martin Scorsese UM PERSONAGEM QUE NOS LEVA PARA AS CORDAS O boxeador Jake LaMotta nunca foi um sujeito agradável. Ao contrário, esbanjava mau-caratismo. Esteve na prisão, estuprou uma mulher, espancou uma vítima até quase matá-la durante um assalto, meteu-se com o crime organizado, foi casado sete vezes e bateu em todas as suas mulheres. A violência estava por toda a sua ficha corrida. Nova-iorquino nascido no Bronx, era descendente de italianos e começou no boxe profissional aos 19 anos, em 1941, tonando-se campeão mundial na categoria peso médio em 1950. Depois da aposentadoria, comprou alguns bares e virou comediante. Também foi ator e participou de vários filmes. Lançou alguns livros, entre eles Raging Bull: My Story , escrito em parceria com os jornalistas Joseph Carter e Peter Savage. Apesar da vida conturbada, virou símbolo de coragem e se tornou um herói para os apreciadores do esporte.           Sinceramente, jamais senti um pingo de empolgação em a

Destemida: com a família dando apoio, sobra determinação!

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Destemida: direção de Sarah Spillane UMA HISTÓRIA INSPIRADORA, QUE NOS SERVE DE MODELO Colocar o filme Destemida , dirigido em 2022 pela australiana Sarah Spillane, lado a lado com o agora clássico Eu, Christiane F. - 13 Anos, Drogada e Prostituída , dirigido em 1981 pelo alemão Ulrich Edel, pode parecer uma aberração. Mas é justamente o que estou fazendo nesta sequência de crônicas, porque enxerguei entre os dois filmes uma forte conexão: a família. No primeiro, ela se impõe pela presença. No segundo, pela ausência! Ambos são protagonizados por meninas, personagens reais que alcançaram, cada uma ao seu modo, alguma projeção mundial. O primeiro filme é edificante e inspirador. O segundo é didático e nos serve de alerta.           Quarenta anos depois que a triste história de Christiane F. chocou o mundo, podemos assistir a um filme que segue na direção oposta. Destemida nos conta a jornada de Jessica Watson (Teagan Croft), uma australiana de apenas 16 anos que, em 2009, tornou-se a pe

Eu, Christiane F. - 13 Anos, Drogada e Prostituída: filme de 1981

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Eu, Christiane F. - 13 Anos, Drogada e Prostituída: direção de Ulrich Edel CONTUNDENTE, DIDÁTICO, REALISTA E ATUAL Neste fim de semana, Ludy e eu vivemos uma experiência de cinema um tanto peculiar. Assistimos a dois filmes protagonizados por meninas, um completamente diferente do outro. No entanto, encontramos neles uma conexão surpreendente: ambos falam de família, só que um nasceu pela falta dela e o outro, por causa dela. No primeiro, a família é uma abstração tão desfocada, que em momento algum lembramos dela. No segundo, a concretude da família é tão nítida, que não há como esquecer dela em nenhuma cena. O primeiro filme é Eu, Christiane F. - 13 Anos, Drogada e Prostituída , dirigido em 1981 por Ulrich Edel. O segundo é Destemida , dirigido em 2022 por Sarah Spillane.           Pensei em desenvolver uma única crônica falando dos dois filmes, mas logo percebi que seria impossível. Primeiro, porque exigiria muitos parágrafos além do usual. Depois, porque fugiria ao padrão da Crônic

O Último Samurai: até que ponto essa história é verdadeira?

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O Último Samurai: direção de Edward Zwick PERSONAGENS FICTÍCIOS E PREMISSAS VERDADEIRAS Há uma interseção entre os faroestes americanos e os filmes japoneses sobre samurais. Um gênero sempre inspirou o outro. Mais que isso, nutriram-se! Os arquétipos apresentados pelo mestre Akira Kurosawa em Os Sete Samurais , realizado em 1954 como uma homenagem aos cowboys, serviu de munição para filmes como Sete Homens e Um Destino , tanto o de 1960, dirigido por John Sturges, como o remake de 2016, de Antoine Fuqua. Cito aqui o exemplo mais óbvio, mas os cinéfilos antenados certamente serão capazes de resgatar outros, ainda mais surpreendentes. Mas em O Último Samurai , realizado em 2003 por Edward Zwick, os elementos se cruzaram para compor um drama épico, pontuado com cenas de guerra e personagens marcantes.           O filme conta a história de Nathan Algren (Tom Cruise), um atormentado capitão do exército americano – durante a Guerra Civil, participou do massacre de milhares de nativos durante

Marshall: Igualdade e Justiça: retrato de um herói autêntico

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Marshall: Igualdade e Justiça: direção de Reginald Hudlin TODOS NÓS SABEMOS O QUE É JUSTIÇA Dramas de tribunal acabaram agrupados em um gênero específico, tanto na literatura como no cinema. Autores como John Grisham, Aaron Sorkin e William Diehl exploraram as diferentes dinâmicas que se estabelecem nas cortes de justiça, usando elementos de mistério e suspense para segurar o leitor – e o espectador – até que o martelo seja finalmente batido. Souberam recitar os cânones e contornar os clichês, sem desapontar o público ávido por... justiça!           Sim, no final das contas, é esse o foco de qualquer drama de tribunal. Sejam leigos, sejam bacharelados, o que todos estão interessados é em ver a justiça sendo exercida em sua plenitude. Reconhecê-la no final, com suas imperfeições e promessas, porém cega e equilibrada e sendo exposta sem disfarces. Mesmo que, no final da trama, ela tropece em parcialidades, ainda assim saberemos que é ela, apenas representada por sua exata negação.       

Conta Comigo: um dos melhores dramas sobre amadurecimento

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Conta Migo: direção de Rob Reiner RESULTADO DE ÓTIMAS ESCOLHAS NARRATIVAS O nome Stephen King está fortemente ligado aos gêneros terror, suspense, fantasia e ficção científica. Foi causando arrepios nos leitores que o escritor vendeu mais 400 milhões de livros mundo afora, arregimentando uma legião de fãs engajados. Mas quando entramos no campo do cinema, há outras de suas facetas que nos saltam aos olhos. Enquanto algumas adaptações de seus romances são para provocar medo, como em O Iluminado , Carrie, a Estranha e It – A Coisa , outras exploram o talento do autor como contador de histórias sensíveis e edificantes. Me refiro a títulos como À Espera de Um Milagre , Um Sonho de Liberdade e Conta Comigo . Este último, dirigido em 1986 por Rob Reiner é o filme que mais destoa no universo de Stephen King – curiosamente, é aquele que o autor considera como sua melhor adaptação!           Esse filme denso e sensível foi baseado em um pequeno romance publicado em 1982, intitulado O Corpo .

A Promessa: denunciando o genocídio do povo armênio

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A Promessa: direção de Terry George CINEMA DENSO, EMOCIONANTE E ÁGIL Numa época em que a indústria do cinema está mais dedicada a oferecer entretimento fácil, voltado para um público concentrado apenas em se divertir, já não há mais cineastas interessados naquele tipo de cinema sério e grandiloquente, assinado por nomes como David Lean. Títulos como Lawrence da Arábia e Doutor Jivago , por exemplo, hoje estão arquivados na prateleira dos... antiquados. Que outro diretor se arriscaria no formato, correndo o risco de se distanciar do público jovem? Terry George, é claro! Em pleno 2016 ele arregaçou as mangas e realizou A Promessa , um filme denso e envolvente, com o porte de uma adaptação literária clássica: conta uma história de amor em primeiro plano, enquanto deixa que o espectador acompanhe no pano de fundo os tristes desdobramentos de fatos históricos marcantes.           Nascido em Belfast, Terry George construiu uma carreira sólida, cutucando temas incômodos, mas sempre relaciona

A Balada de Buster Scruggs: a mitologia do velho oeste tratada com humor inteligente

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A Balada de Buster Scruggs: dirigido pelos irmãos Coen CINEMA DE QUALIDADE MULTIPLICADO POR SEIS Como um garoto urbano, nascido em 1960, fui criado na frente do aparelho de TV, aquele móvel imenso, que ocupava todo um canto da sala, mas tinha uma tela proporcionalmente pequena. Era dotado de um tubo de raios catódicos, que quando atiçado por uma insondável traquitana eletrônica valvulada, exibia imagens em preto-e-branco. O tubo demorava alguns segundos para... esquentar, até que a imagem ficasse clara o suficiente. E com sorte, também ficaria nítida, se as condições atmosféricas não atrapalhassem. Chuviscos e fantasmas eram a regra e acabaram se incorporando à linguagem da televisão, uma mídia ainda jovem, mas esforçada em entregar uma programação variada: desenhos, novelas, esportes, shows de auditório, seriados e... filmes!           Foi através da TV que o cinema entrou no meu cotidiano. Porém, os filmes exibidos na telinha eram... velhos! Novidades? Só nas salas de exibição. Na ma

A Luz no Fim do Mundo: um drama pós-apocalíptico intimista

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A Luz no Fim do Mundo: direção de Casey Affleck MÁXIMA DENSIDADE EMOCIONAL A paternidade veio ao meu encontro quando estava para completar 30 anos. Colocou-me em uma condição diferente. Não era mais aquela do rapaz independente, agarrado às minhas paixões, que encontrava sentido nos braços da mulher que amava. Era uma outra, mais adulta e mais exigente. Na condição de pai, senti-me como se a vida tivesse me dado uma promoção. Agora, eram os meus braços que precisavam carregar mais responsabilidades. E como eles eram desajeitados! Tensos e inseguros, tremiam quando segurei minha filha pela primeira vez. Mas logo peguei o jeito. Foi quando entendi que ser pai é seguir se alternando entre duas obrigações inadiáveis: ensinar e aprender. Ensinamos o tempo todo, aprendemos o tempo todo... E nem vemos o tempo passar!           O primeiro ensinamento que vem com a paternidade é sobre generosidade. Com um filho, mudamos de atitude. Nada de esconder o jogo, ou sonegar informação. Queremos entreg

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