As Pontes de Madison: amor romântico e maduro

Cena do filme As Pontes de Madison
As Pontes de Madison: direção de Clint Eastwood

O FILME ELEVOU O ALCANCE DO LIVRO

As Pontes de Madison nasceu como livro. Não um livro qualquer, mas um estrondoso sucesso comercial que chacoalhou o mercado editorial dos anos 1990, quando virou best seller instantâneo; até hoje, já foram impressos mais de 50 milhões de exemplares em todo o mundo. A quantidade, porém, não validou a qualidade: os críticos torceram o nariz, dadas a falta de substância literária e a pouca profundidade dos personagens. O autor, Robert James Waller, falecido em 2017, jamais se deixou perturbar pelas críticas negativas; escreveu outros romances que também entraram para as listas dos mais vendidos e ajudaram a consolidar sua carreira. Fenômeno comparável aconteceu com Cinquenta Tons de Cinza, romance de autoria da inglesa Erika Leonard James, que explodiu em sucesso nos anos 2010 – esse acendeu uma chama erótica bem mais intensa do que aquele, entretanto, conseguiu reduzir ainda mais a qualidade literária.
        Um ano antes de ser publicado, em 1993, o livro As Pontes de Madison já prometia se tornar um sucesso comercial, tanto é que Steven Spielberg comprou os direitos de adaptação para as telas e iniciou o projeto de produção. Clint Eastwood envolveu-se como ator e produtor desde o início e posteriormente abraçou a direção do filme, finalmente lançado em 1995. Contornou a falta de qualidade literária do material original e realizou uma obra memorável, com qualidade cinematográfica suficiente para se tornar um título relevante no seu currículo. Antes de adentrar nos detalhes, vamos examinar a sinopse:
        As Pontes de Madison conta a história de Francesca (Meryl Streep), uma dona de casa de origem italiana que mora no condado de Madison, no estado do Iowa, com o marido, Richard (Jim Haynie) e os filhos, Carolyn (Sarah Kathryn) e Michael (Christopher Kroon). Em 1965, quando eles viajam para participar de uma feira estadual, ela prefere ficar sozinha em casa; é quando entra em cena o fotógrafo Robert Kincaid (Clint Eastwood), que chega para realizar uma série fotográfica sobre as belas pontes cobertas da região, para uma reportagem da revista National Geographic. Robert bate à porta de Francesca pedindo informações sobre como chegar a uma das pontes e ela faz mais: acompanha o fotógrafo e se entrega a um caso amoroso que dura apenas quatro dias, mas deixa marcas profundas em sua vida – que ela registra em um diário escrito em três volumes.
        Entre o livro e o romance há diferenças narrativas decisivas. Na adaptação escrita pelo experiente roteirista Richard LaGravenese – ele também escreveu e dirigiu o filme Escritores da Liberdade – a envolvente história é contada pelo ponto de vista de Francesca. Além disso, Clint Eastwood e Steven Spielberg decidiram iniciar o filme mostrando como seus filhos, já adultos e interpretados por Annie Corley e Victor Slezak, descobrem os diários da mãe recém-falecida e se constrangem ao saber que ela viveu um caso extraconjugal. A partir daí, o romance entre Francesca e Robert é contado em flashback.
        A tentativa de dar alguma profundidade aos demais personagens do romance é louvável, mas resultou em cenas demasiado forçadas e um tanto protocolares; contribuiu para fazer de As Pontes de Madison um filme longo demais e um tanto arrastado. Por outro lado, aos nos revelar os acontecimentos pelos olhos de Francesca, o filme ganha em sensibilidade e verossimilhança. No romance de Waller, o fotógrafo Robert Kincaid é uma máquina sexual, que combina poder físico e sensibilidade emocional, num composto estereotipado para reagir à química do feminismo na época idealizado. Sedutor, poético e espirituoso, é ele quem dá a sua versão da história – escrita com evidente mediocridade e apresentada de forma idealizada.
        No filme, As Pontes de Madison se eleva em qualidade e sensibilidade artística. Como diretor, Clint Eastwood faz a sua mágica ao lançar mão da simplicidade como regra de conduta; seu cinema é objetivo, direto e em favor dos personagens. Como ator ele entrega uma atuação discreta e generosa para com Meryl Streep, que encontra espaço para brilhar com a intensidade necessária – no limite do excesso de sentimentalismo. A dupla trabalha ao nível das microexpressões e dos pequenos gestos para compor seus personagens; ele, um caubói de meia-idade seguro em sua masculinidade; ela, uma caipira solitária agarrada aos valores que cultiva desde sempre. Criam um encantamento sem apelar para os elementos de sedução mais óbvios.
        As Pontes de Madison ainda guarda uma certa coloração piegas, mas é por causa do material original, que se entrega à pieguice com despudor. O filme fala sobre um amor proibido e desenvolve com elegância e inteligência a fantasia erótica que eventualmente visita as donas de casa reclusas em suas rotinas e entediadas. Ou seja: tem estofo para figurar no topo da lista de muitos cinéfilos e cinéfilas.

Resenha crítica do filme As Pontes de Madison

Título original: The Bridges of Madison County
Ano de produção: 1995
Direção: Clint Eastwood
Roteiro: Richard LaGravenese
Elenco: Clint Eastwood, Meryl Streep, Annie Corley, Sarah Kathryn Schmitt, Victor Slezak, Christopher Kroon, Jim Haynie, Phyllis Lyons, Debra Monk, Richard Lage, Michelle Benes

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