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Ladrões de Bicicleta: valores de pai para filho

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Ladrões de Bicicleta: filme dirigido por Vittorio De Sica NEO-REALISMO NAS MÃOS DE UM DIRETOR COM TOTAL CONTROLE DA ESTÉTICA Quando assisti a Ladrões de Bicicleta , dirigido por Vittorio De Sica em 1948, foi no final dos anos 1970. Já era, portanto, um filme velho – ao menos do ponto de vista de um estudante de 17 anos, hipnotizado pelo cinema vibrante que se fazia na época. Aproveitei uma mostra sobre o neo-realismo italiano apresentada no cineclube da minha escola. A sessão foi revestida com um certo verniz intelectual e teve direito a debate no final, além de entediantes e demoradas interpretações, eivadas de clichês ideológicos, sobre o alcance social da obra e blablablá...           Na saída, o que trouxe comigo foi a história tocante de um pai tentando fazer o certo e um filho de mãos agarradas ao exemplo, apertando o passo para alcançar o que pudesse aprender. Esteticamente, é uma obra marcante, com a narrativa ancorada no discurso visual e realizada com grande sensi

Eu, Robô: filme mostra que a revolução da I.A. pode ser perigosa

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Eu, Robô: filme dirigido por Alex Proyas O VISUAL É ARREBATADOR, MAS O RESULTADO LEMBRA APENAS VAGAMENTE AS HISTÓRIAS DE ASIMOV Quando comecei a me tornar um leitor independente – aquele que não se detém às exigências das salas de aula – meu gênero preferido era o romance policial. Tinha uns 12 anos. Depois de ler alguns Sherlock Holmes e 007s, parti para os livros de ficção científica. Foi aí que Arthur C. Clark e Isaac Asimov se tornaram meus ídolos. O primeiro, cutucando minha imaginação de viajante espacial, o segundo, metendo medo com a ideia de que um dia os humanos deixarão de ser os habitantes mais inteligentes da Terra.           No cinema, Arthur C. Clark ganhava disparado de Isaac Asimov. O primeiro, tinha sido eternizado por Stanley Kubrick com o brilhante 2001: Uma Odisseia no Espaço . Já o segundo, tinha que se contentar com o raso Viagem Fantástica , de Richard Fleischer. Queria que Asimov virasse o jogo. Tentava imaginar como ficariam suas histórias de robôs transpostas

O Exorcista: um clássico que continua assustador

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O Exorcista: filme dirigido por Willian Friedkin EFEITOS ESPECIAIS AJUDAM, MAS O IMPORTANTE É SABER CONTAR A HISTÓRIA Quando foi lançado em 1973, O Exorcista virou fenômeno por toda a mídia. Nas rodas de conversas, era assunto obrigatório. Nunca um filme de terror havia conquistado tanto espaço no imaginário do público, nem na crítica especializada. Para um garoto de 14 anos, interessado em cinema, assistir ao filme seria uma conquista – prova de coragem e oportunidade de se aproximar do mundo adulto. O problema é que ele não era permitido para menores de 18 anos. Naquela época, a censura era dura e implacável!           Mas encontrei a solução: um amigo três anos mais velho me emprestou um exemplar do livro O Exorcista , escrito por William Peter Blatty, também autor do roteiro que foi às telas de cinema. A capa, que não seguia o padrão gráfico dos cartazes do filme – lembro que trazia uma ilustração medieval – era mais artística do que assustadora. Mergulhei na leitura.           Pe

12 Anos de Escravidão: uma história verídica

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12 Anos de Escravidão: filme dirigido por Steve McQueen ELE SOFREU A PIOR DAS INJUSTIÇAS Em 1841, Solomon Northup era um homem exemplar. Casado, pai de três filhos, era instruído e letrado. Apaixonado por música, exercitava sua liberdade e levava uma vida honesta e produtiva, numa Nova Iorque repleta de oportunidades. Por outro lado, também conheceu o lado sombrio da humanidade e viveu horrores inimagináveis. Ele os registrou em  sua autobiografia intitulada  12 Anos de Escravidão , uma narrativa de grande valor literário e relevância histórica publicada em 1853 . O cineasta Steve McQueen e o roteirista John Ridley transportaram sua história para as telas e realizaram um dos mais importantes filmes sobre o drama dos escravos no sul dos Estados Unidos.           12 Anos de Escravidão , de 2013, é um filme arrebatador. Conta como Northup, enganado por dois sujeitos abjetos, acaba sequestrado e levado para Nova Orleans, onde é vendido como escravo. Sem identidade, sem direitos individuais

A Escolha de Sofia: diante de um dilema devastador

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A Escolha de Sofia: filme dirigido por Alan J. Pakula UM CLÁSSICO COM DENSIDADE DRAMÁTICA ESMAGADORA Que mundo emergiu da Segunda Guerra Mundial? Depois que as bombas cessaram, que os soldados se cansaram, que a paz foi instituída por decreto, quem eram as pessoas que tentavam seguir com suas vidas? Willian Styron tentou nos dar uma ideia em seu livro A Escolha de Sofia , lançado em 1979. O diretor Alan J. Pakula adaptou a obra para o cinema e realizou um clássico, que de tão denso e contundente até hoje emociona.           Pelas lentes de Pakula, A Escolha de Sofia é um filme enclausurado, confinado a uma linguagem teatral e solene. E não poderia ser diferente! Conta a história de Stingo, interpretado por Peter MacNicol, que em 1947 chega ao Brooklyn perseguindo o sonho de se tornar escritor. Vai morar numa pensão, onde conhece Sofia Zawistowska, vivida por Meryl Streep e seu namorado Nathan Landau, vivido por Kevin Kline. Ela, uma sobrevivente do holocausto que se esforça para parec

Crime Sem Saída: filme policial com Chadwick Boseman

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Crime Sem Saída: filme dirigido por Brian Kirk UM POLICIAL INFALÍVEL AGINDO DO LADO CERTO: RECEITA DE BOM ENTRETENIMENTO Tem certos dias em que tudo o que preciso é relaxar. Esfriar a cabeça. É quando o cinema de entretenimento se torna a melhor pedida. Nada de tramas intrincadas, abordagens psicológicas, referências literárias, criações artísticas que exigem bagagem cultural... Um filminho leve, despretensioso e escapista é um santo remédio!           Quando compartilho a televisão com a Ludy, a escolha relaxante recairá sobre uma comédia romântica, uma aventura ou mesmo um drama leve. Minha mulher não suporta filmes violentos. Se estou sozinho, será um filme de ação, com tiros, perseguições, lutas... O problema é encontrar um filme de ação leve, despretensioso e escapista que seja bom. No último final de semana tive sorte!           Crime Sem Saída , filme de 2017 dirigido por Brian Kirk é uma dessas gratas surpresas, que nos põem relaxados no sofá. Traz uma trama policial si

A Mula: a idade não põe limites em Clint Eastwood

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A Mula: filme dirigido por Clint Eastwood ATOR, DIRETOR E PERSONAGEM SE FUNDEM NESSE ÍCONE DO CINEMA Um escritor, lidando com palavras e com a imaginação do leitor, pode incorporar qualquer protagonista e assumir sua voz. Pode se passar por um homem, uma mulher, criança, jovem, da terceira idade... Se for um contador de histórias experiente e talentoso, pode f alar no lugar de qualquer um e ainda assim passar credibilidade.  Já um ator e diretor de filmes autorais tem que encontrar uma história que lhe sirva. Tem que escolher um personagem que inspire autenticidade. Um artista como Clint Eastwood faz disso uma vantagem! Foi o que ele fez em  A Mula , filme que dirigiu e estrelou em 2018.           O roteirista Nick Schenk costurou uma trama sob medida para a estatura desse ícone da sétima arte, que nasceu em 1930 e continua na ativa. Seu roteiro foi baseado num artigo do New York Times escrito por Sam Dolnick, que contava como Leo Sharp, um veterano da Segunda Guerra Mundial, entrou pa

Os Sete de Chicago: fatos reais que chocaram o mundo

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Os Sete de Chicago: filme dirigido por Aaron Sorkin UM FILME DE TRIBUNAL ONDE RESPIRAMOS O GÁS LACRIMOGÊNEO DOS ANOS 60 Ao lidar com temas políticos, um diretor sabe que será julgado pela plateia sob dois parâmetros: pela sua ideologia e pelo seu cinema. No filme os Sete de Chicago , de 2020, Aaron Sorkin soube manter sua ideologia a uma distância discreta, mas não poupou espaço para o seu ótimo cinema! Realizou essencialmente um filme de tribunal, com todos os cacoetes do gênero e repleto de momentos eletrizantes.           Como roteirista, Aaron Sorkin já revelou seu talento em filmes como Questão de honra , Jogos de Poder e A Rede Social . Como diretor, já havia realizado A Grande Jogada . Agora, escreveu e dirigiu o filme  Os Sete de Chicago , depois que o diretor destacado originalmente – ninguém menos que Steven Spielberg – teve que abandonar o projeto. Saiu-se bem! O filme narra um episódio histórico na vida jurídica e política dos americanos, que contribuiu para es

Operação França: linguagem inovadora e Gene Hackman na linha de frente

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Operação França: filme dirigido por Willian Friedkin O FILME QUE DITOU UM PADRÃO ESTÉTICO PARA O GÊNERO Sim... Operação França já foi um filme moderno, intenso, ousado e arrebatador. Isso foi há mais de 50 anos. Em 1971, quando William Friedkin o realizou, causou comoção nos cinemas. Era um filme para adultos, que escancarava o submundo do tráfico de drogas em Nova Iorque – uma cidade que, vejam só, se mostrava suja, com bolsões de pobreza, barulhenta... Os protagonistas eram policiais, mas ficavam a dever em refinamento. Desgrenhados, vulgares e moralmente questionáveis, não se furtavam ao uso da brutalidade e da violência. Os bandidos, bem... esses eram refinados, elegantes, sutis, discretos...           Câmera instável, cores não saturadas, cortes secos, locações realistas... Aos olhos do espectador atual, nenhuma novidade. Há meio século, uma linguagem inovadora, que fez escola e influenciou os thrillers policiais. Podemos encontrar em Operação França a gênese das perseguições de

Uma Segunda Chance: filme estrelado por Harrison Ford

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Uma Segunda Chance: filme dirigido por Mike Nichols UM GRANDE ROTEIRO DESPERDIÇADO   Entre os incontáveis títulos disponíveis nos serviços de streaming, há muitos que nem sequer conheço. Então, de vez em quando reservo um tempinho para o garimpo – atividade que exige paciência e nem sempre surte bons resultados. Nesta semana, o filme que caiu na minha bateia foi Uma Segunda Chance , de 1991, dirigido por Mike Nichols e estrelado por Harrison Ford.           Indo direto ao ponto: o filme é uma grande decepção. Conta uma história envolvente, tem narrativa fluente, elenco competente e design de produção esmerado. Mas não funciona! Assistindo ao filme, na medida em que as cenas aconteciam, ficava cada vez mais intrigado: por que o filme não acontece? Por que não emociona?           Uma Segunda Chance conta a história de Henry Turner, um advogado bem-sucedido, que está no topo da cadeia alimentar do mundo dos negócios em Nova Iorque. É dono de uma ambição desmedida e de um caráter duvidoso

A Travessia: uma façanha real

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A Travessia: filme dirigido por Robert Zemeckis UM EQUILIBRISTA COM ALMA E VISÃO DE ARTISTA Quando o francês Philippe Petit estendeu secretamente seu cabo de aço entre as coberturas dos dois maiores edifícios até então já construídos pelo homem e caminhou sobre ele com audácia e destemor, realizou uma façanha única. A imagem do equilibrista sereno e seguro, desafiando a finitude – pontinho vitorioso maculando um céu monótono – ganhou status de verdadeira instalação artística. Nada de atração circense, nada de espetáculo mambembe. A intervenção urbana que espantou o mundo naquele ano de 1974 foi a visão de um artista ousado tornada realidade.           Usar a palavra equilíbrio para se referir a Philippe Petit pode parecer um trocadilho, mas há que reconhecer: foi o que ele promoveu ao unir competência técnica e consciência artística para assumir seu lugar no mundo. No topo dele!           Ocorre que esse topo do mundo eram as torres gêmeas do World Trade Center em Nova Iorque, na época

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