A.I. Inteligência Artificial: com final idealizado por Stanley Kubrick

Cena do filme A.I. Inteligência Artificial
A.I. - Inteligência Artificial: direção: Steven Spielberg

SINERGIA DE DUAS INTELIGÊNCIAS CINEMATOGRÁFICAS

Stanley Kubrick era um caçador de histórias. Quando encontrava uma que o surpreendia, apropriava-se dela com a voracidade de um felino compenetrado e não sossegava enquanto não conseguisse adaptá-la para as telas. Em 1969 ele leu um conto publicado na revista de moda Harper’s Bazaar, escrito por Brian Aldiss e intitulado Super-Toys Last All Summer Long. Pronto! Encontrou uma história pela qual valeria a pena mover montanhas para filmar. E moveu, mas não viveu para vê-lo concretizado.
        O conto era sobre máquinas inteligentes convivendo com seres humanos solitários, num futuro sombrio onde apenas poucos recebem permissão para ter filhos. Monica Swinton e seu marido Henry vivem com o filho David, mas não conseguem ser plenamente felizes. Ela não consegue se relacionar com o garoto e tenta de tudo para desenvolver alguma afetividade por ele. Compra um brinquedo robô, Teddy, na esperança de que ele sirva de ponte entre os dois, mas é em vão. Então, um belo dia Henry chega em casa com a grande notícia: o casal foi sorteado pelo governo para ter um filho! Descobre-se então que David também é uma máquina inteligente, que agora será descartada. Enquanto vai sendo levado de volta para a fábrica, o garoto robô elabora pensamentos sobre o amor que sente por sua mãe, sem saber o que o destino lhe reserva.
        O primeiro passo para concretizar essa história em filme seria escrever o roteiro. Isso só acabou acontecendo em 1990, quando Stanley Kubrick contratou o roteirista Ian Watson para desenvolver os primeiros rascunhos. Durante nove meses os dois trabalharam para estruturá-lo – evidentemente, com Watson submetido ao rígido controle criativo de Kubrick. Enquanto o cineasta ia abraçando seus demais projetos, a história, agora batizada de Inteligência Artificial, acabou sendo inviabilizada. Engavetado, o roteiro adormeceu por anos, enquanto Stanley Kubrick alimentava uma certeza cada vez mais imperiosa: esse filme deveria ser realizado por Steven Spielberg.
        Os dois cineastas trocaram muitas informações sobre o filme. Kubrick sempre passando instruções e detalhando sua visão criativa em torno da história. Spielberg sempre relutante, ocupado com seus próprios projetos. Depois da morte de Kubrick em 1999, realizar A.I. – Inteligência Artificial tornou-se uma missão abraçada com determinação por Spielberg. Seu filme, lançado em 2001 – uma grande data! – veio como uma homenagem ao cineasta e foi recebido pelo público com grande receptividade, tornando-se um grande sucesso comercial. O roteiro assinado por Ian Watson traz algumas diferenças em relação ao conto de nove páginas que o gerou.
        No filme A.I. – Inteligência Artificial, Mônica Swinton (Frances O'Connor) e seu marido Henry (Sam Robards) estão sofrendo com a perda iminente do filho, acometido por uma doença terminal. Para confortar a mulher, o marido traz para casa o robô David (Haley Joel Osment), uma inteligência artificial projetada com a aparência de uma criança e programada para amar incondicionalmente sua mãe. O relacionamento entre Monica e David não decola, ainda que ela tente apelar para a intermediação do brinquedo Teddy, um urso de pelúcia falante. A reviravolta acontece quando o filho do casal, curado, deixa o hospital e volta para ocupar seu lugar na casa. Já não há mais espaço para David. Ele é descartado e agora terá que descobrir o que fazer com o imenso amor incondicional que sente por sua mãe. Um amor que há de durar por toda uma eternidade.
        Filmando com profundo respeito e em reverência ao mestre Kubrick, Spilberg nos entregou um filme memorável. A.I. – Inteligência Artificial é uma sinergia de duas inteligências eternizadas na história do cinema, que fala sobre as implicações de termos máquinas programadas para sentir e expressar emoções. Fãs e cinéfilos de diferentes facções colecionam histórias de bastidores, variadas especulações e um sem número de teorias a respeito de como teria sido o final do filme nas mãos de Kubrick. A maioria aposta que o final certamente não seria tão otimista quanto este que Spielberg filmou. Bobagem! A versão de Spielberg segue rigorosamente as determinações de Kubrick.
        O final do filme já estava lá, no roteiro escrito por Ian Watson sob a supervisão de Kubrick. Ao contrário do que muitos acreditam, a história não terminaria com David e Teddy imersos na água esperando que suas baterias se esgotassem. Kubrick idealizou a história seguindo por dois mil anos adiante. Até mesmo a concepção visual dos seres artificiais do futuro – que alguns confundem com alienígenas – foi estabelecida por Kubrick. Spielberg estava consciente da visão filosófica de seu colega acerca da história e se dedicou a chegar o mais perto que pôde dela. Design de produção, cenários, posicionamentos de câmera... O que temos aqui é uma homenagem feita com reverência e capricho.
        Se Spielberg pode ser acusado de algum tipo de interferência em A.I. – Inteligência Artificial, certamente é em relação à música. Aqui ele contou com a usual colaboração de John Williams. Ainda assim ouvimos algumas passagens da música erudita, tão apreciada pelo mestre Stanley Kubrick.

Resenha crítica do filme A.I. - Inteligência Artificial

Ano de produção: 2001
Direção: Steven Spielberg
Roteiro: Steven Spielberg e Ian Watson
Elenco: Haley Joel Osment, Jude Law, Frances O'Connor, Brendan Gleeson e William Hurt

Comentários

  1. Como sempre uma ótima crítica. Observando todos detalhes do roteiro e sua produção.

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